Crítica completa: https://www.gamedesignhub.com.br/post/lil-gator-sobre-como-nos-tornamos-adultos-chatos-critica

Jogar Lil Gator sendo um adulto é como assistir a um dos bons filmes da Disney que dialogam tão bem com qualquer faixa etária, como Divertidamente, por exemplo.

Estamos falando de um jogo extremamente fofo e casual, em que controlamos um jacarézinho chamado Lil Gator, que tenta captar a atenção de sua irmã mais velha, que tanto se esforçava para diverti-lo com brincadeiras extremamente criativas quando era um bebê.

Acontece que alguns anos se passaram e a "irmãzona" agora está na faculdade, com muitos trabalhos e projetos que drenam a sua atenção. O pequeno jacaré então bola um plano com seus amigos de construir uma aventura épica pra chamar a atenção de sua irmãzona, e assim começa a aventura de Lil Gator.

Com um trope simples da "Lenda do Herói", extremamente parafraseada do herói Link, de The Legend of Zelda, Lil Gator não mede esforços na criatividade para contar uma história sobre valorizar a nossa criança interior. O pequeno jacaré é enérgico, capaz de enxergar papelões e punhados de confete como inimigos, espadas, escudos e projéteis.

Mas a obra também é assertiva em nos mostrar que, com a vida adulta, os sonhos de infância vão se perdendo, e que isso não significa necessariamente um amadurecimento.

Inclusive, o próprio amadurecimento é controverso, já que um dos seus "sintomas" reflete em deixarmos a contemplação e o lúdico de lado. Não existe mais pausa, não existe calma, é sempre a próxima tarefa, a próxima graduação, o próximo objetivo. A vida que sentíamos, que sonhávamos é descartada. Estar presente e perceber o que acontece à nossa volta vira sinônimo de perda de tempo.

Em uma discussão com amigos recentemente, sobre burnout e neurodivergências como o TDAH, levantamos algumas questões sobre como a mecanicidade do mundo, a exigência da fragmentação e especialização da vida como um todo, acaba nos rotulando e nos afastando ainda mais do que é considerado como ideal socialmente falando.

Se não cumprimos uma tarefa X em tempo Y, se não ganhamos o salário Z, todas essas questões vão se acumulando e nos tornando escravos de um sistema que nos desgasta à força, tentando nos transformar em uma engrenagem "funcional".

E esse, pra mim, é um dos motivos que nos faz abandonar a cosmovisão lúdica da vida, em que até parar para brincar com seus filhos deve ser terceirizado a fim de que você não perca tempo em alcançar os seus "objetivos".

O renomado médico húngaro Gabor Maté, especialista em desenvolvimento infantil, em um podcast recente, disse que se ele tivesse a chance de voltar atrás na vida ele a teria vivido de forma diferente, e a obra que ele citou como catalisadora desse sentimento de arrependimento por ter abandonado a contemplatividade da vida foi nada mais, nada menos, do que o livro que deu origem à história do Ursinho Pooh.

Segundo ele, o último trecho do livro citado foi responsável por lhe arrancar lágrimas durante anos.

"Onde quer que vão e aconteça o que acontecer pelo caminho, naquele lugar encantado no topo da floresta, um menino e seu Urso estarão sempre brincando."

Lil Gator é simplesmente isso, uma obra que nos faz refletir sobre o momento em que paramos de brincar, e como isso nos torna seres humanos chatos, insípidos e sem cor.

Reviewed on Apr 10, 2024


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