Eu já estava de olho em Signalis desde seu lançamento no ano passado e, depois da minha maratona recente de Resident Evil, a vontade de jogá-lo subiu ainda mais. A junção de survivor horror com ficção científica é um sopro de ar fresco e acerta bem no meu ponto fraco.

Agora, finalmente tive a oportunidade de saciar essa vontade. Terminei a campanha na dificuldade Survival, após 12 horas de uma experiência avassaladora em termos de direção de arte e estética, acompanhada ainda por uma ludonarrativa digna de ser uma das mais brilhantes já vistas no meio dos videogames. Por outro lado, os elementos principais que compõem a jogabilidade infelizmente não conseguem fazer jus à excepcionalidade do restante do jogo.

https://www.youtube.com/watch?v=CUtKLDfQ1Sw

Signalis é obviamente inspirado em diversas mídias e, muitas vezes, as referencia de forma direta e sem pudor. Há elementos retirados de Silent Hill (inclusive um lugar literalmente chamado de "Nowhere"), de Resident Evil (uma das coisas mais legais é a inclusão da mecânica de queimar os corpos, semelhante ao remake do 1) e até mesmo de obras fora dos videogames. O jogo possui um leve quê de Tsutomu Nihei (em especial de sua obra-prima, Blame!), chega a retirar um plano do primeiro filme de Ghost in the Shell de maneira quase idêntica e conta com conceitos visuais remanescentes de Neon Genesis Evangelion e do anime de Monogatari Series. E mesmo tendo tantas inspirações assim, o jogo ainda estabelece uma identidade extremamente marcante e original.

O design de personagens realizado por Yuri Stern, que criou o jogo ao lado de Barbara Wittmann, é lindo. Se baseando em um estilo característico de anime, Yuri dá aos personagens uma beleza esplendorosa que ressalta os aspectos mais emocionais da história e contrasta belamente com a atmosfera mórbida e surrealista.

As cutscenes, por sua vez, são algumas das mais cativantes que já vi em um jogo. O trabalho de direção e de composição é denso e carrega muito significado por trás de cada plano, mesmo quando inspirados em cenas de outras obras. O conceito de "mostre, não conte" é frequentemente empregado com bastante sutileza durante esses momentos, tornando-se responsável por criar um quebra-cabeça intrigante, mas acessível.

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A ideia de desenvolver personagens e acontecimentos por meio de documentos e cartas espalhadas pelo cenário é um clichê já visto trocentas vezes em jogos do gênero. Embora o uso desse elemento não seja nada diferente em Signalis, a combinação de outras técnicas narrativas e a exploração do movimento surrealista dão ao enredo do jogo profundidade. Como se não bastasse, a forte presença de obras de arte reais, como o livro O Rei de Amarelo (Robert W. Chambers) e as pinturas A Ilha dos Mortos (Arnold Böcklin) e A Costa do Esquecimento (Eugen Bracht), também dão mais vivacidade à história, além de um simbolismo sublime.

A construção de mundo é outro destaque. Seja na figura das inúmeras personagens femininas que evidenciam o matriarcado desse universo, sejam documentos e itens do cenário que indicam a situação política em larga escala vivenciada ali, é tudo introduzido com muito esmero e naturalidade. Até mesmo os personagens secundários, como Isa e Adler (que se mostra um antagonista muito curioso mesmo com pouca presença direta em tela) possuem arcos próprios muito bem pensados.

Se trata de uma história enigmática e que, ao final, talvez não forneça necessariamente todas as respostas, porém é executada com excelência. Dos quatro finais possíveis (que são genialmente determinados dependendo de como o jogador aborda o jogo durante toda sua duração, ao invés de fornecerem escolhas óbvias), eu consegui o "Promise", que acabou sendo o meu favorito mesmo após assistir aos outros no YouTube. Todas as conclusões são provocantes, mas o maior fechamento temático de Promise transmite um sentimento lindamente agridoce.

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No entanto, mesmo em meio a tantos elogios (ou talvez justamente por conta deles), o jogo me desapontou um pouco. Não entendam errado, a jogabilidade proposta é competente o bastante, mas fica aquém da qualidade espetacular do enredo e da direção de arte, e por isso decepciona.

Existem mecânicas boas (como o rádio e a possibilidade de pisar em inimigos caídos para abatê-los com menos munição) e puzzles muitíssimo criativos, mas o level design que acompanha tudo é tão anêmico e repetitivo que afeta a experiência toda negativamente. São salas e mais salas que fornecem pouca variedade à forma como o jogador progride ou interage com elas. As fases variam em termos meramente estéticos, enquanto se mantêm todas iguais em jogabilidade.

Eu evitei o combate o máximo possível durante todo o jogo, porém a quantidade grande de monstros na fase final mostra como o sistema de mira é frustrante, se negando a focar no inimigo que o jogador realmente precisa. Os inimigos também possuem pouquíssima variação e raramente afetam como o jogador deve abordá-los.

No fim, ainda é um bom jogo que eu recomendaria facilmente, mas mesmo entendendo as limitações técnicas e os obstáculos impostos a um time pequeno de apenas dois artistas, é difícil abandonar o desejo de que Signalis fosse, na verdade, uma obra-prima em todos os sentidos.

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Reviewed on Jul 21, 2023


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