This review contains spoilers

Em Spelunky 2, mais especificamente em um dos possíveis segundos níveis do jogo, a Selva, existem homens da caverna tribais que aperecem através da geração procedural dos levels aqui e ali. Um dos inimigos mais comuns do jogo nesse estágio, o homem das cavernas tribal vem em algumas variações: Às vezes não carregam arma alguma; às vezes seguram um bumerangue (uma variação bem perigosa, inclusive, capaz de te matar por stunlock sem grandes problemas); em telas de escuro na Selva, seguram uma tocha que arremessam ao ver o jogador, antes de sair correndo para persegui-lo.

Uma outra variação é o que segura um escudo simples e rústico de madeira, uma proteção limitada, que pode ser facilmente quebrada com uma arma ou ataque adequado.

Foi o que eu pensei ao, dentro de uma das minhas 1000+ runs no jogo, dar um tiro de shotgun nesse homem das cavernas com escudo pela frente, minha arma era forte e o adversário, patético. O tiro saiu, o escudo quebrou, ele morreu imediatamente, e eu morri também.

Minha primeira reação foi achar que algum bug extraordinário tinha acontecido. Imediatamente salvei a gameplay em vídeo e fui rever o que aconteceu. Pra minha surpresa eu vi, ao assistir a minha morte de novo em slow motion, as múltiplas balas/ partículas individuais saindo da minha shotgun e chegando ao escudo, exatamente duas delas sendo refletidas de volta pra mim, uma quebrando o escudo e as outras acertando o homem tribal.

Não há como descrever o quão prazeroso é perceber a profundidade de detalhes e variedade de interação que existe entre níveis, armas, ações, mecânicas, cenários, jogador e inimigos nesse jogo, o qual parece simples a princípio, mas que está sempre pronto pra te pegar de surpresa com um acontecimente inusitado como o descrito ali em cima. Todos acontecendo por motivos que o jogo propõe, justifica e te desafia a experimentar.

Sim: Profundidade, variedade e precisão, esses são os melhores substantivos pra associar a um jogo como Spelunky 2 (e o seu antecessor). Uma vez dominadas as mecânicas do jogo e com um certo nível de familiaridade com o que ele tem a oferecer, o jogo se torna um passeio intenso, onde o jogador se sente uma especie de ninja, capaz de prever múltiplas interações entre coisas e lidar com elas em tempo real. Estratégia e habilidade se misturam em um flow de gameplay único. Mas o jogo nunca para de te surpreender mesmo assim.

É importante ressaltar que essa satisfação eventual não vem a baixo custo. Um grande pilar da franquia Spelunky é o nível de dificuldade altíssimo. Por horas, as mortes inusitadas parecem mais injustas que inusitadas e runs promissoras podem ir por água abaixo em uma fração de segundos: Algo vai bater em você e te jogar em um buraco com espinhos no chão, você vai cair em cima de uma planta carnívora ao tentar pular no meio do escuro ou talvez uma gota enorme de lava caia na sua cabeça vinda de uns dois patamares acima, onde algo explodiu sem que você pudesse ver ou saber e abriu o chão. Lidar com isso é o grande teste de Spelunky e, se o jogador se dipõe a aceitar a realidade do que aqui está sendo proposto, as frustrações e a relação de amor e ódio se tornam uma experiência única, meio difícil de descrever, mas profundamente instigante. De fato, as runs mais longas e vitoriosas, que eventualmente acontecem, acabam ganhando um ar épico e a adrenalina e a sensação de recompensa por chegar onde nunca se havia chegado antes é ímpar.

Spelunky 2 é um Rogue Like puro, cruel e sem muitas rédeas, mas que está disposto a te surpreender se você estiver disposto a se dedicar a ele. Em comparação ao primeiro jogo (também uma obra prima de duas gerações de consoles atrás) ele é ainda mais rápido, dinâmico, variado e preciso. É a versão definitiva dos jogos da franquia até aqui e (pra mim) um dos maiores jogos de todos os tempos.

Agora, com licença, que eu ainda não cheguei no final extra secreto, que estou tentando há anos. Vou tentar só umas cinco runs, eu juro, e depois vou dormir (eu vou tentar umas vinte runs).

Reviewed on Dec 29, 2023


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