(Review de 2015)

Fire Emblem Awakening é o décimo quarto jogo da franquia Fire Emblem e é atualmente o jogo da série com o maior número de unidades vendidas. A franquia Fire Emblem consiste de RPGs de estratégia em turnos, onde você controla um grupo de personagens, cada um com suas classes e habilidades, para atingir seu objetivo. Dessa vez tomamos controle dos Shepherds o exército da cidade de Ylisse liderado pelo príncipe Chrom. A história gira em torno de Chrom e possui três grandes eventos, a guerra contra Plegia, a invasão do Reino de Valm e a tentativa de ressurreição do dragão caído Grima. Esses eventos chegam a se entrelaçar em certas partes da trama, mas no geral elas são tratadas como eventos distantes um do outro. Essa escolha é bastante curiosa, pois com uma história assim, o jogador poderia perder o foco da história, mas isso não chega a acontecer. Para uma trama de três partes, Awakening tem um ritmo muito bom, tudo acontece de um jeito natural e não forçado, e nada é deixado para trás sem resposta. Os personagens brilham durante o jogo, cada possui uma personalidade única e carismática, e interagem um com o outro de uma maneira que entretém o jogador. Visto o quão importante esses personagens são para o gameplay, dá pra ver que criar uma personalidade para cada um deles foi uma das prioridades da Inteligent Systems, a produtora do jogo. Alguns inimigos e antagonistas do jogo foram muito bem criados, mas infelizmente a maioria possui objetivos bem clichés como "dominar o mundo" e etc. Antes de começar a jogar você precisa criar um personagem próprio, desde a aparência até alguns de seus atributos em batalha, o Robin (Você pode mudar o nome, mas seu nome original é Robin). A opção de criar um personagem traz alguns problemas dos quais a produtora consegue resolver apenas alguns. O principal problema é que um personagem com stats (atributos) controláveis quebra completamente o jogo no quesito balanceamento. Ao final do jogo, seu personagem é tão forte que pode passar alguns níveis sozinho sem problemas. Não são todos os stats que podem ser escolhidos, ao invés disso o jogador é forçado a escolher 2 stats - um para aumentar e outro para diminuir. Isso amena, mas não acaba com o problema por algumas razões: primeiro porque em certas classes você não precisa de alguns stats, se você quiser fazer do seu Robin um mago você não precisa de Atk. Segundo que esses efeitos são muito pequenos e lá pelo meio do jogo você nem percebe a diferença. O meu Robin, por exemplo foi uma mistura de magia e espada, então eu aumentei meu Skill e diminui Luck. No meio do jogo eu possuía mais Luck que a maioria dos outros personagens. Visto que Robin também é possivelmente o personagem mais importantes da história, os produtores precisavam criar uma personalidade que se assemelha à do jogador e ainda ser carismática o bastante para interagir com os outros personagens de uma maneira divertida. É uma tarefa bem complicada, pois não há um certo modelo que irá satisfazer todo mundo, pois quanto mais personalidade Robin tem, menos pessoas irão gostar dele e, consequentemente, da história do jogo que basicamente gira em torno dele. Por outro lado, transformar o Robin em um personagem mudo também traria graves problemas pois seus soldados interagem um com o outro o tempo todo, e forçar o jogador a criar um personagem que não conversa com ninguém seria um erro terrível a se fazer. Felizmente a Inteligent Systems fez um ótimo trabalho nesse aspecto, Robin consegue ser um personagem social sem ao mesmo tempo ser excêntrico demais ou tomar decisões desnecessárias. Ele tem personalidade o suficiente para se camuflar no meio dos outros personagens, mas falta personalidade o bastante para o jogador se identificar com ele. Parece que mesmo os próprios produtores tinham dúvidas sobre a personalidade do personagem, visto que um modo estava planejando para fazer do Robin um protagonista silencioso, como em outros RPGs. No fim, eles optaram por jogar essa ideia fora e melhorar o personagem, o que na minha opinião valeu muito mais a pena. Embora o jeito que isso foi realizado seja um bem cliché, a amnésia do Robin faz parte da história e é o motivo de um certo plot twist pelo final do jogo. Me parece que a ideia da amnésia foi escolhida antes mesmo de pensarem em sua personalidade.

A história não se apresenta de um jeito extravagante na maioria das vezes, os personagens não divagam muito do evento principal e geralmente apenas servem para introduzir um personagem ou o perigo a ser enfrentado naquela fase. Há algumas exceções, claro, principalmente nos capítulos finais, mas no geral os diálogos são bem simples. O jogo apresenta algumas animações maravilhosas em CGI, mesmo com a capacidade gráfica do 3DS. O jogo em si também é bem bonito, a artwork dos personagens são bem feitas, mas os modelos durante as batalhas poderiam ser melhores. O 3D funciona bem, sem downgrades ou quedas de quadros, mas não faz tanta diferença fora das batalhas. A trilha sonora é incrível, as músicas são muito bem orquestradas e fazem um bom trabalho em produzir a atmosfera desejada. A transição perfeita de músicas na hora do combate merece ser mencionado: durante o gameplay, a música de fundo geralmente é calma enquanto você está pensando no seu próximo movimento, e muda para uma versão mais agitada da mesma música. É um detalhe bem pequeno olhando o jogo como um todo, mas para isso ser possível, os compositores precisaram criar duas versões idênticas da mesma música, uma mais calma e uma mais agitada, de uma forma onde a transição entre uma e outra seja perfeita. Tanto trabalho para apenas um detalhe mostra a determinação dos produtores para criar uma experiência satisfatória. Após criar seu personagem, não demora até o jogador for introduzido no gameplay de Fire Emblem. Há vários tutoriais aqui explicando os básicos do jogo, mas diferente de outros RPGs e até mesmo outros Fire Emblems, os tutoriais aqui não atrapalham o ritmo do jogo pois estão na tela de baixo enquanto a ação acontece na tela de cima. Os tutoriais fazem bem o seu trabalho de ensinar os jogadores novatos sem atrapalhar a jogatina dos veteranos. A base do gameplay é a mesma dos jogos antigos, porém com algumas coisas novas e alterações em sistemas antigos que mudam o jeito de jogar. Há basicamente quatro tipos de armas, físicas, magia, arcos e cajados de cura. As armas físicas, espadas, machados e lanças, além de possuírem diferenças entre si, trazem a mecânica de weapon triangle, onde elas formam um efeito “pedra-papel-tesoura” entre si. Há dois tipos de classes, básicas e avançadas, cada uma com um tipo específico de arma que pode usar. Quando uma classe básica chega ao nível 10, ela pode usar um Master Seal para mudar para uma classe avançada. Novo em Awakening, você também pode usar um Second Seal para mudar para outra classe do mesmo tipo que a sua. O Second Seal abre centenas de possibilidades para o jogador, pois agora todo o personagem pode ser de qualquer classe, o que resulta em grandes opções de customização para o jogador. Outra coisa que difere entre classes são os skills que aprendem, habilidades especiais exclusivas de cada classe. Essas habilidades foram introduzidas muito antes na série, mas são bem mais importantes em Awakening do que em qualquer outro jogo até agora graças ao sistema de parentesco, que vou falar mais tarde. Reintroduzir os skills desse jeito dá mais peso na escolha de classes, pois a diferença entre elas deixa de ser apenas stats e quais armas podem usar e, com o Second Seal, os personagens podem ter qualquer combinação de skills.

Infelizmente algumas mecânicas foram retiradas ou simplificadas, muito provavelmente por causa da pressão em cima produtores. Fire Emblem nunca foi uma série que vende muito fora do Japão, e Awakening seria a última chance de lançar um FE para o ocidente. Por causa disso eles deveriam ter certeza de que ele apelaria para o maior número de pessoas possível, e por causa disso muitas coisas dos jogos antigos acabaram sendo retiradas para deixar o jogo mais simples e acessível. A maior e mais notável é a presença de um “casual mode”, onde se seus personagens morrerem em batalha, eles são revividos quando ela termina. O casual mode não é exatamente um problema pois está restrito à um modo somente e não influencia nos jogos de quem não o escolher, é só uma opção para os não confiantes. Outras mudanças, no entanto, foram feitas no gameplay e infelizmente afetam o jogo inteiro, um exemplo disso é o jeito de que magias são tratadas aqui. Em todos os outros jogos, as magias possuíam efeitos de “pedra-papel-tesoura”, onde Fogo ganha de Vento, Vento de Trovão e Trovão de Fogo. Nos jogos de gameboy, outro triângulo foi criado em cima desse envolvendo as magias acima (Anima), magias de luz e magias negras. Embora possua as magias de fogo, vento, trovão, Awakening não possui nenhum triângulo mágico para se sustentar, magias negras ainda existem mas não dão dano extra à nada, e magias de luz foram removidas por completo. Pior ainda foi a retirada do sistema de peso. Nos jogos antigos, cada arma tinha seu peso que influencia na velocidade e esquiva do seu personagem. Armas mais fortes eram mais pesadas, o que criava um dilema na hora de equipar seu personagem, armas pesadas que dão bastante dano ou armas leves que dão menos dano, mas dependendo da sua speed te dão a chance de atacar mais vezes ou esquivar mais facilmente dos ataques do inimigo. Esse sistema fazia com que as armas fracas que você ganha mais cedo no jogo ainda tem um uso, e que nem sempre a opção mais forte é a melhor. Com a retirada do sistema de peso, armas mais fracas não possuem valor algum quando você recebe uma mais forte, o que remove uma camada inteira de estratégia por trás de equipar seus personagens. Não é mais necessário usar a Steel Sword quando se tem uma Silver Sword no seu inventário, já que ela não oferece mais as vantagens que oferecia antes em relação à mesma. O sistema de peso funcionava com o stat de constituição, se sua con fosse menor que o peso da arma, a diferença era subtraída de sua velocidade. Com o passar dos anos esse sistema foi recebendo mudanças que acabam deixando algumas classes mais fracas que outras, mas isso não é desculpa para retirar o sistema por completo.

O sistema de dual retorna em Awakening, agora bem mais incentivado do que em outros jogos da série. Durante a batalha, se dois dos seus personagens lutarem em espaços adjacentes um ajudará na batalha do outro, dando buffs ao atacante, defendendo um golpe ou atacando junto com ele. A cada batalha, a amizade entre os dois personagens aumenta, então quanto mais eles se ajudam, mais se aproximam e, consequentemente, se ajudam mais. O elo entre dois personagens é dividido em ranks, de D à S, a cada subida de rank o jogador é presenteado com um diálogo entre os dois personagens, elas podem variar entre cômico e trágico, e certas vezes revelam a backstory dos personagens. Quando dois personagens do sexo oposto atingem um rank de afinidade S, eles se apaixonam e se casam, e, dependendo do personagem, tem filhos. Há sidequests onde versões crescidas desses filhos aparecem do futuro na esperança de mudar seu destino. É um conceito bem estranho no papel, mas tudo é muito bem explicado e combina bem com a história principal. Além de características físicas, esses filhos possuem as skills de ambos os pais, o que podem resultar em certas combinações bem interessantes. No geral, os filhos do futuro são uma ótima adição ao jogo, deixando sua história mais única e trazendo novas mecânicas no gameplay. Os diálogos entre os personagens são um bônus divertido que não quebram o ritmo do jogo e providenciam certo desenvolvimento dos personagens presentes nele. Robin também tem pode dialogar com os outros personagens, e é aqui que sua personalidade é testada com força total. Novo em Awakening é a opção de pair-up, onde dois soldados ocupam o mesmo espaço e batalham juntos, um no combate e outro como suporte. Na prática, ele é extremamente poderoso e deixa o jogo muito fácil em todas as dificuldades não chamadas Lunatic e Lunatic+. Há durante o jogo algumas “casas especiais” que incentivam e recompensam exploração do cenario, as vezes acabam forçando o jogador a sair de sua rota planejada para coletar seu bônus. É um elemento bem pequeno durante o gameplay, especialmente pelo final do jogo onde você já tem level e armas em abundância, mas ele faz bem sua função sem interromper o ritmo geral do jogo. Então durante o gameplay você deve prestar atenção na classe e armas do inimigo, sua área de ataque, o posicionamento dos seus personagens, terreno, casas especiais e ao mesmo tempo mantendo certos personagens próximos para que eles criem um bom rank de relacionamento. Isso pode parecer muito para alguém que nunca jogou um game de estratégia antes, mas todas essas mecânicas são introduzidas e explicadas separadamente, e ajudando o jogador a se familiarizar com elas.

Após o terceiro capítulo, onde as principais mecânicas já foram introduzidas e desenvolvidas, o mapa se abre e o jogador encontra sua primeira sidequest, chamados de Paralogues. O jeito que Awakening jogo trata sidequests não difere de outros rpgs, aparecem após um tempo e consiste em pequenos desafios que variam da história principal de alguma forma, sendo um personagem novo ou o objetivo da missão. Há dois tipos de paralogues: Os referentes às crianças do futuro que podem ser recrutadas, e os que contam um pequeno conflito que não faz parte da história principal, onde você pode ou não recrutar um personagem totalmente novo. O mapa em si é uma boa adição ao jogo, e tem muitas funcionalidades parecidas com o Sacred Stones para o GBA. Cada casa com uma fase já feita se transforma em uma loja, onde há itens e armamentos novos e a opção de melhorar armas já compradas. Cada loja possui itens diferentes, o que dá um pouco de variedade a cada uma delas, mas torna um pouco difícil procurar um certo item que você quer. Felizmente os produtores aliviaram esse problema espalhando mais os itens entre as lojas, mas não deixa de ser um problema especialmente pelo final do jogo onde o mapa aumenta drasticamente de tamanho e fica complicado memorizar cada loja. No mapa, o jogador pode encontrar e batalhar com os Risen, os monstros do jogo, mas infelizmente eles não são tão bem bolados quanto às sidequests. Ao ligar o jogo ou completar uma missão, monstros vão aparecendo e desaparecendo do mapa, e você pode batalhar contra eles para um exp fácil, eles reusam os mapas de fases passadas e o desafio é menor que o das missões principais e paralogues. Eles são opcionais, no entanto, e não irão te atacar se você não quiser, mas se você quer comprar um item em uma loja e um risen está sobre essa loja, você precisa atacá-lo primeiro. Eles podem ser chatos mas não são um grande problema, na verdade são uma grande melhora na versão do Sacred Stones, onde você não poderia passar por eles sem batalhar. Awakening ainda possui algumas funções online, embora nenhuma seja tão importante quanto a história principal. O jogo utiliza do Streetpass para trocar times com outras pessoas que o jogador encontra pela rua, que aparecerão no seu mapa como um npc que você pode comprar itens ou batalhar contra, e até recrutar seu personagem. Não espere encontrar ninguém de surpresa, no entanto, é um jogo bem velho e você só irá usar esse modo de jogo se combinar com um amigo antes. Você também pode receber itens, missões e times pelo spotpass, os times sendo referências dos outros jogos da franquia. Assim como no streetpass os capitães de cada time são recrutáveis e seus times são mais difíceis que os inimigos do modo história. Os itens, no entanto, são bem overpowered e deixam o jogo ainda mais fácil do que ele já é, especialmente durante o começo do jogo. Infelizmente não há um multiplayer 1x1, mas as missões foram feitas para serem jogadas com duas pessoas, e trabalhar junto a um amigo é bem divertido as vezes.

Fire Emblem Awakening é um excelente game que acabou salvando a franquia no ocidente e é até hoje um top seller no 3DS. Para aqueles que não conhecem a série ou o gênero, não há lugar melhor para começar do que aqui, com suas mecânicas um pouco mais simples do que seus antecessores. Apesar disso, aqueles que querem um grande desafio não acharão aqui além dos modos Lunatic e Lunatic+ que chegam a ser bastante injustos às vezes, os jogos mais antigos da franquia podem ser mais de seu agrado.

Reviewed on Nov 03, 2020


Comments