Já faz um tempinho que eu tô jogando esse daqui, mais tempo do que eu normalmente passo jogando um JRPG porque a vida me alcançou e eu não estou tão vagabundo assim. Por isso eu acho que eu consegui sintetizar muito bem minha relação com Shin Megami Tensei 5 por ter passado mais tempo pensando nele do que o normal.

Uma das coisas que sempre me deixa muito intrigado em começar um novo Shin Megami Tensei é ver como ele vai subverter a fórmula básica da franquia. Todos eles são superficialmente semelhantes, mas profundamente diferentes. Sempre é sobre pegar demônios no mundo pós apocalíptico alienante e agressivo enquanto você lida com dilemas morais pertencentes aquele mundo. SMT5 utiliza o Nocturne como base pra subverter a semelhança da franquia e transformar esses pontos plurais em algo único na história. Você é um estudante que em menos de uma hora de jogo se transforma num meio-demônio pra poder batalhar na criação do novo mundo e superar os limites da mortalidade. O negócio é que nesse jogo você não é um meio demônio, e sim um "proto-demônio", além de outras coisas pontuais que não são exatamente desse jeito que eu contei, mas ao longo da história esses pequenos pontos vão sendo desconstruídos pra se tornar algo único.

O problema que ao invés de Shin Megami Tensei 5 ser profundamente diferente, ele é superficialmente diferente. Não no sentido de que as coisas inerentes a esse daqui são poucas pra diferenciar ele de um outro jogo da franquia: pelo contrário, ele é um recorte da franquia bem único no que ele tenta fazer. Ênfase no tenta. O sentido de superficialmente diferente se vale de que ele nunca vai pra lugar algum. Quanto mais você avança na história do jogo em certo ponto, mais ela começa a se fragmentar em um Frankenstein claramente inacabado. Os temas antropológicos que a franquia é conhecida por explorar são basicamente uma bengala pra fazer um espetáculo visual, porque eles realmente não são bem inseridos no roteiro. Provavelmente por culpa da pandemia, muitas ideias narrativas desse jogo não foram bem polidas, ao ponto de que ele se beneficiaria muito bem de um "Maniax". Ainda sim, eu não acho ela horrível, eu curti bastante o final que eu peguei mesmo sendo bem simples, só que a história é claramente inacabada e é esse o ponto que SMT5 mais peca pra mim num geral. E é meio triste dizer isso, porque o espaço entre basicamente o quarto jogo e esse daqui é quase de uma década. Shin Megami Tensei 5 demorou tanto pra ser lançado que eu achei que ele tinha saído em 2019 ou algo assim, mas foi em 2021. Ele ficou tanto tempo voando na cabeça de quem gostava da franquia na época que eu fiquei surpreso quando eu percebi que ele só tinha 2 anos, porque na minha cabeça ele tinha muito mais, e ainda sim a história parece ser inacabada.

Dito isso, esse jogo é divertido pra um caralho. Arrisco dizer que ele é um dos JRPGs que eu mais gostei de entender pra conseguir fazer uma engenharia reversa nos desafios do jogo. Explorar o mundo aberto é muito divertido, mesmo sendo um repeteco de objetivos (possivelmente por esse jogo ser muito lindo e estar rodando num switch) e a maioria das side quests não serem tão boas assim, ainda sim a base que ele monta é engajante o suficiente pra o simples ato de catar orbes e procurar por Mimans enquanto você luta com demônios ser uma das experiências mais divertidas que eu já tive com um jogo dessa franquia. Eu sinto um pouco de falta das dungeons, esse jogo tem umas três (?) dungeons apenas, e considerando que eu demorei umas 50 horas pra zerar ele sem contar as mortes isso é pouca coisa. É uma franquia conhecida por seu dungeon crawling, então me parece meio errado ter esse número ínfimo de dungeons.

Esse é o primeiro jogo que eu jogo num Switch, e provavelmente vai ser o único por muito tempo porque os jogos nessa porra custam o olho da cara. Eu tava esperando um jogo meio feinho, mas eu acabei me deparando com um dos jogos mais lindos em direção artística que eu já vi. Tem várias cutscenes que usam do enquadramento pra evidenciar isso, mas no próprio mundo enquanto você anda tem várias paisagens lindas. Os mapas são bem parecidos mas tematicamente eles são diferentes o suficiente pra te fazer sentir em outro mundo. A atmosfera desse jogo é do caralho, e apesar da direção artística ter um peso muito grande pra fazer essa atmosfera funcionar, eu acho que não seria possível se não fosse pela trilha sonora. Puta merda, a ost desse jogo vai DURO. Como sempre as músicas dos jogos da mainline são bastante inspiradas no industrial e no metal, mas nesse daqui as coisas parecem ter sido modernizadas pra experiência sonora não ser tão agressiva quanto um Nocturne mas não ser agradável igual um Persona, e isso forma uma puta trilha diversificada e ela sozinha é uma das minhas favoritas na série inteira.

Mesmo que SMT5 não seja um jogo livre de defeitos, a minha experiência nele foi muito agradável. Eu tava esperando um jogo bem pior, mas no que ele acerta, ele acerta muito bem. Eu só digo pra você jogar com cautela, porque dependendo do que você estiver esperando ele pode te decepcionar. Independente disso, curti demais ele.

Edit: não faz nem UM MÊS que eu comprei a porra desse console com o intuito basicamente de jogar SMT5, e anunciaram uma versão nova chamada de Vengeance. Eu sou um fudido mesmo....

Reviewed on Feb 14, 2024


4 Comments


3 months ago

Acho que maioria dos problemas que o SMT V tem são por tentar demais apelar para o que o Nocturne foi. Desde o Nahobino até o mesmo estilo de história. Cada jogo da franquia fazia uma mudança na formula, seja o ""medieval"" do IV até o mais computadorizado(usando de exemplo os designs dos primeiros jogos). A Atlus quis jogar muito seguro, uma coisa que é praticamente desconhecida na franquia. Tanto que é por isso que cada jogo da franquia é super reconhecível. Strange journey, Nocturne, IV e outros tem aquela arte e até mesmo aquele visual que de longe nós podemos reconhecer, mas já o V?...

Fico triste, pois hoje em dia parece que o jogo foi esquecido até. Enfim, ótima review!! Adorei ler e genuinamente concordo com alguns pontos que você escreveu. E os defeitos que citou são os motivos de eu ter escrito isto aqui.

3 months ago

Pra mim o real problema é que as únicas partes mais elaboradas da história do jogo são as que se parecem com o Nocturne, o começo e o final. O resto do jogo parece muito uma "gordura" pra você chegar no final. Os personagens, diferente do Nocturne, são muito rasos e não parecem ser receptáculos pra os ideais deles igual o Nocturne era. Daí toda esse meio do jogo que não se passa entre o começo e o fim tenta dar mais profundidade pros personagens, mas tem um personagem que literalmente só tem um desenvolvimento antes de você entrar na última dungeon e esse desenvolvimento se resolve em ele colocar o cabelo pra trás e tirar o boné. Eu não acho ele tão parecido com o Nocturne assim, mas eu também acho que ele joga seguro demais com a fórmula da franquia. Eu não cheguei a jogar o 4, mas o 2 por exemplo é literalmente uma subversão inteira do primeiro jogo e o terceiro é uma experiência muito única até hoje dentro da franquia. E o 5 é o 5, tem conceitos interessantes apresentados no começo (eu te juro que eu genuinamente curti a ideia dos dois mundos coexistirem mas acabou que não deu em nada) mas que é só isso. Tá surgindo um rumor de uma versão nova do 5, eu espero que consigam arrumar os problemas dele nessa nova versão, mas eu não fico muito esperançoso porque né, Atlus. Enfim, fico feliz que você tenha curtido ler a review! Tmj

1 month ago

Smt v é mid

1 month ago

@Waltzs infelizmente não posso discordar dessa afirmação