Eu adoro a série Rance, e esse era um jogo que eu aguardava ansiosamente uma tradução por se tratar de um evento muito interessante para esse universo que estava sendo trabalhado desde o ano de 1991, no terceiro jogo da série lançado lá para aqueles PCs japoneses que a galera acha 'aestethic'.

Em Rance III, Patton Misnarge, o filho bastardo do imperador do país de Helman, inicia uma invasão ao país de Leazas sob o pretexto de que, se a invasão for um sucesso, ele finalmente poderá provar seu valor e ser nomeado o próximo imperador, já que no momento há um jogo político para colocar a sua jovem irmã que poderá ser facilmente utilizada como fantoche. Essa invasão falha miseravelmente, e no quarto jogo da série, em 1993, aprendemos que Patton ainda está vivo e que ainda existem pessoas leais a ele. Inicia-se um movimento revolucionário que enxerga em Patton a figura que irá livrar Helman da atual monarquia corrupta que apenas ganhou força com a sua queda. Em Kichikuou Rance, de 1995, temos um jogo que opera em grande escala nesse mundo e a revolução de Helman liderada por Patton é apenas um pedaço da experiência. A série Rance sofre um reboot com Rance 5D de 2002, desconsiderando Kichikou. Em 2004, com Rance VI, temos o retorno de Patton que participa em uma guerra civil no país de Zeth, e nesse jogo o personagem é amplamente explorado quase como se em algum momento do futuro, a revolução de Helman se daria em um jogo solo totalmente focado nesse evento, mas agora com uma repaginada do personagem Patton que antes era um cara arrogante, mas que agora entende que a luta precisa ser feita em favor do povo. Ou seja, houve um trabalho de 23 anos para finalmente esse evento se concretizar, isso no Japão, pois caso você tenha esperado sair a versão localizada da Mangagamer, põe aí uns 32 anos simbólicos nessa conta. Eu sou apaixonado pelo Patton e os camaradas de Helman, e por isso, esse jogo foi muito antecipado por mim.

Acontece que o jogo não é perfeito. Na questão de jogabilidade, eles trabalham esse misto de RPG tático de turno ao estilo 'musou', já que temos golpes que funcionam em um grid, sendo possível matar vários inimigos com o uso de técnicas especiais que atingem os vários "quadradinhos" do cenário. É divertido no começo, mas a quantidade de personagens no mapa faz o jogo se tornar um pouco lento. É possível desligar as animações para fazer o jogo correr, no entanto.

O que me interessa aqui é o aspecto visual novel, no entanto. Sim, para quem não sabe, Rance é uma série de jogos eróticos, só que a história é tão envolvente e o personagens são tão legais, que não é nada irônico da minha parte dizer que o que realmente faz com que eu me importe com esses jogos do Rance é o plot.

O interessante da série Rance é que todos os jogos acabam se conversando de uma forma ou outra. Chega a ser interessante como o final de cada jogo justifica o plot do jogo seguinte, com a única exceção sendo 5D, que é um ponto fora da curva por vários motivos que não convém explicar aqui. Alguns jogos são grandiosos e expandem esse universo de maneira a mudar tudo o que sabemos da história desse mundo, com exemplos sendo: III, IV e VI; enquanto os outros são jogos mais contidos, mas não menos importantes. O que Rance IX faz, é ficar no meio dessas duas categorias, esse é um jogo que tem a função de fechar pontas soltas dos jogos passados, e ser o pontapé de Rance X, fim da série Rance e remake espiritual de Kichikuou Rance, trabalhando novamente esse tema da união da humanidade, que atravessa esses jogos.

Como a maior parte dos jogos eróticos japoneses para o público masculino, a série Rance se propõe a trazer menininhas bonitinhas e burrinhas para compor esse atrativo principal, e Rance IX não é muito diferente. No entanto, aqui eles tentam uma coisa nova já que o protagonismo está sempre na maior parte nos rapazes da série. A série Rance tem tanta personagem feminina igual, que é uma novidade muito boa um jogo focado nessa galera que acaba tendo muito mais personalidade que a grande parcela das personagens femininas desses jogos. Os rapazes roubam a história para eles e compõe as diversas cenas mais emocionantes e fodas de todo o jogo.

As personagens femininas, por uma ironia do destino, estão mais sem graça do que nunca aqui; servindo na maioria das vezes apenas como uma justificativa para as cenas eróticas. Isso salvo uma exceção, a Mineva, que aqui carrega com ela uma história também emocionante a ponto de ser um paralelo ao Patton caso esse não tivesse mudado como pessoa no decorrer dos jogos. Ela é uma das melhores personagens do jogo.

No entanto, eu vou ter que confessar que eu gosto muito da Miracle, que é uma menina bonitinha burrinha que cai na história absolutamente do nada, é totalmente irrelevante, mas que apesar de tudo, é uma personagem extremamente engraçada já que ela e o Rance são dois imbecis. Os melhores diálogos e piadas do jogo envolvem ela. É entretenimento puro ao contrário das outras personagens femininas que estão totalmente apagadas na história e aparecem só porque são favoritas dos fãs.

A narrativa é feita de uma forma muito direto ao ponto, é bem "videogueimificada" e até certas vezes acaba incomodando um pouco já que algumas coisas ficam muito previsíveis. Uma outra coisa que me incomoda é que em jogos passados fica bem evidente, além de ser trabalhado de forma bem competente, a questão da geopolítica desse universo. Esse seria o jogo perfeito para ir mais a fundo nisso, mas as coisas ficam superficiais demais a ponto de algumas cenas não terem o impacto que deveriam.

Em resumo, Rance IX foi um jogo bem satisfatório apesar de não ter sido conduzido de uma forma que tenha me agradado tanto. Apesar disso, no que ele acerta, ele acerta em cheio, e por isso eu tenho um grande respeito por esse jogo que recebe uma estrela a mais na nota por alguém que escreve esse texto de forma bastante emocionada que poderia falar mais sobre esses personagens, e como eu gosto do Patton, por horas e horas.

-

A merda de estudar Marx é que agora fico com um gosto amargo na boca já que, na realidade, a Revolução de Helman em Rance IX iria resultar em uma democracia burguesa visto que a revolução não foi pautada na luta de classes colocando o protagonismo para a classe trabalhadora. O meu mano Patton teve a melhor das intenções, no entanto. É bizarro porque Helman é um país fictício inspirado na Rússia, achei que o roteiro iria um pouco a fundo nessa questão.

Inconformado que os desenvolvedores do meu joguinho visual novel rpg tático musou erótico japonês não são comunistas kkkkk

Reviewed on Apr 08, 2023


3 Comments


1 year ago

Às vezes tenho vontade de estudar Marx, mas aí olho pro tamanho de O Capital e bate uma preguiça... XD

1 year ago

@CDX Eu também nunca li os livros d'O Capital, mas o Marx (e o Engels também) acaba retomando vários dos conceitos dessa obra em outros livros menores, fora os livros e textos de outros autores que conseguem dar uma introdução muito boa ao tema. Eu leria os livros d'O Capital apenas para consultar coisas específicas. Mas também é aquela coisa, são ideias bem abstratas que tem hora que é difícil de entender, mas estamos na luta.

1 year ago

Não quero ir nesses outros autores porque Marx é um daqueles escritores acadêmicos velhos que acabam sendo muito deturpados nas diversas interpretações da obra. Mas isso não é problema, tenho já um videocurso sobre O Capital aqui pra me ajudar quando eu for ler o original, hahahaha.

Só preciso juntar coragem, aquela porra é enorme. XD