Se eu tivesse que descrever 80 Days em uma palavra, a palavra seria "subversivo". Felizmente não sou limitado a usar apenas uma palavra para descrevê-lo!

80 Days subverte Jules Verne de duas formas. Primeiro, e de forma mais óbvia, há a pegada steampunk que o estúdio inkle dá a história. Esses elementos steampunk se integram perfeitamente à obra original, que tem um grande foco nas movas formas de transporte da época e o alcance global do império britânico. Se coisas como ferrovias e barcos à vapor não impressionam tanto os leitores modernos como faziam em para os do século XIX, com a abordagem steampunk a sensação de deslumbramento é resgatada — descobrir que formas intrigantes de transporte vamos encontrar pela frente, sejam camelos mecânicos ou cidades flutuantes, é uma das partes mais prazerosas do game.

A segunda forma de subversão é como o texto colonialista e imperialista do original ganha aqui um subtexto anti-colonial. Essa subversão é profunda, já que não se limita ao autor. É uma desconstrução do próprio gênero de literatura de viagens do original e do steampunk da nova obra. Esses dois gêneros são quase que inerentemente coloniais e imperialistas: o primeiro fruto da era das Grandes Navegações e apresentando ao público europeu um mundo novo selvagem e exótico; e o segundo fundando-se numa extensão fantástica da primeira revolução industrial. Mas esses gêneros não precisam ser assim, e a roteirista Meg Jayanth consegue brilhantemente inverter essa epistemologia. Viajar é uma forma de conhecer novos lugares, aprender sobre novas culturas e, ao final da jornada, mudar a si mesmo. E nesse mundo steampunk em que você viaja e descobre, a fantasia é usada não para repetir no imaginário as estruturas de dominação da realidade, mas para imaginar caminhos não seguidos por aqueles que bravamente resistiram a dominação. Isso sim é botar o punk em steampunk.

Reviewed on Aug 26, 2023


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