Obra Dinn é como um novelo de lã emaranhado e cheio de nós que você vai lentamente desembolando. O destino das 60 pessoas que entraram no navio está entrelaçado e descobrir o que aconteceu com Fulano muitas vezes exige saber o que aconteceu com Beltrano, o que também vai te dar dicas sobre Sicrano e assim por diante. É possível passar alguns períodos consideráveis sem desvendar nada até que a resolução de um caso começa um efeito dominó que termina com várias resoluções simultâneas. A sensação de "eu sou um gênio" desses momentos é um dos grandes trunfos do jogo.

Claro, isso vai depender um pouco da abordagem de cada um com o game, e aí reside outro grande trunfo de Obra Dinn, sua não-linearidade. O navio é um ambiente perfeito para se colocar uma trama densa e convoluta e após a introdução você pode investigar cada parte dele na ordem que quiser. Essa não-linearidade não se limita ao espaço. O tempo também se tornou convoluto nessa arca amaldiçoada, com você revisitando os momentos finais de vários indivíduos em desordem cronológica. Ordenar cada uma das pequenas narrativas que você se depara de forma lógica e montar uma história que faz sentido é o grande quebra-cabeça que interliga os destinos de cada um dos tripulantes.

Como não há uma ordem definida para se experienciar os casos e a história do navio, alguns casos parecem carecer de informação crítica quando na verdade ela já foi mostrada umas duas horas antes e você não prestou atenção porque não parecia importante. No início do jogo isso é fácil de contornar devido à própria natureza não-linear da obra. Emperrou num caso? Sem problemas, parte pra outro. Provavelmente quando você voltar aqui vai ter uma visão geral muito melhor do que aconteceu ou terá eliminado outros suspeitos. Entretanto, nem sempre as coisas prosseguem de forma tão graciosa e seria mentira de minha parte se eu não admitisse que encontrei algumas soluções na base da força-bruta — principalmente no capítulo VII.

Dito isso, pelo menos em princípio a força bruta não parece ser estritamente necessária. Um guia bem interessante que me deparei depois que zerei se chama How you're supposed to identify people e elabora quais são as dicas ou passos dedutivos que podem levar à identificação lógica de cada tripulante do navio. Mesmo após ler o guia ainda teve uns momentos que pensei "ah, qualé, quem é que iria descobrir isso?", mas Obra Dinn não seria um adventure sem pelo menos um ou outro puzzle que só é óbvio para o designer.

Por fim, não posso deixar de elogiar a estética visual magnífica. Tenho certeza que deve haver ensaios inteiros sobre como Lucas Pope reimagina e resignifica as imagens em preto e branco cheias de dithering dos antigos Macintosh, então vou poupar a internet de mais um. Em vez disso, gostaria de dar destaque para a atenção que Pope deu para que todo o cenário, roupas, apetrechos que as pessoas usam, ferramentas e etc fossem o mais genuínos possíveis. Um trabalho colossal que tem meu respeito de historiador.

Reviewed on Jun 30, 2022


1 Comment


1 year ago

Muito feliz em saber que não fui o único que teve que apelar pra força bruta nos últimos casos. =P