A Plague Tale: Requiem, um final para um franquia fantástica, que conta com um desenvolvimento fascinante e que tem maturidade para se manter fiel a construção do enredo que a mesma propõe.

O escopo da obra no segundo título está na ideia de conseguir curar a mácula de Hugo, no primeiro jogo com toda sua construção o objetivo alcançado foi se sair vivo de todo o pandemônio na cidade natal dos irmãos, mas nem por isso a mácula para de evoluir, agora a cura é necessária para que Hugo possa levar uma vida normal. A mácula ainda continua como elemento principal que ronda toda a obra e além dela também está presente a construção de uma maturidade dos irmãos.

É quase certo a ideia do final ser feliz em vários jogos que seguem essa proposta do A Plague Tale: Requiem, tudo dá certo no fim e isso já estava me incomodando muito durante todo o jogo, não havia cura para Hugo, isto estava claro, e Amicia a todo momento dizendo que caso os dois ficassem juntos ia dar tudo certo me irritava profundamente, era um ar muito infantilizado rodeando a obra. Por isso o final é surpreendente, há uma maturidade em todos os aspectos, em Hugo, que percebe que aquele é o único jeito da mácula parar, não é mais uma desistência banal da vida mas sim uma maturidade emocional, a maturidade em Amicia está na percepção de que era o fim e ela que deveria dar o ponto final e a maior maturidade de todos está no roteiro, que arca com um fim desagradável mas que corresponde com toda a construção da obra até ali, o enredo não é ignorado para servir a um final ideal dos desenvolvedores, ele se mantém fiel a si mesmo até o fim, nunca abandonado sua coerência interna.

Em relação ao sentimentos trabalhados pela obra tem-se o que é comum em jogo de stealth só que é bem reduzido nesse jogo se comparado com o primeiro da franquia pois ele apresenta maiores possibilidades de avanço no puzzles além da stealth, logo o elemento de ação está bem mais presente. Além disso, a explosão de sentimentos é absurda ao final do game com uma mistura de pena, dor e angústia.

A partir da construção das personagens no primeiro jogo da franquia, se tem os irmão de Rune com a relação de irmandade já consolidada, já está presente o amor, respeito e carinho encontrado em qualquer relação de irmãos no qual ambos se gostam. Por isso, a construção das personagens nesse segundo jogo está mais ligado aos ensinamentos que Amicia passa para Hugo, o exemplo, essa construção se dá com a Amicia em um primeiro momento com uma sede de sangue gigantesca que é controlada ao decorrer do jogo e após isso Hugo também demonstra a mesma sede de sangue, então a questão do exemplo da irmã mais velha está presente. Além disso, outro elemento presente na construção das personagens é Amicia como um porto seguro para Hugo, este que em vários momentos pensa em desistir de tudo e se entregar a mácula tem em Amicia a sua salvação e motivação para continuar lutando.

Pensando em relação às mecânicas, vale mais a pena relatar as mudanças do que repetir o que já estava presente no primeiro jogo da franquia. Uma mudança interessante são as portas com tranca quando o jogador vence uma etapa do capítulo, quando isso ocorre o jogador sabe que teve sucesso e que ele pode se “acalmar”, essas demarcações eram difíceis de serem percebidas no primeiro jogo e são adições bem vindas. Outra boa mudança é a interface de das armas/alquimia ela se tornou bem mais fácil de mexer e mais rápida, sem precisar de abrir o inventário a todo momento, além disso a reformulação na mecânica de aprimoramento foi muito bem vinda, se tornou bem mais simples e intuitivo a forma como se melhora os perks de Amicia. Um último detalhe que vale a pena ressaltar é a maior variedade de possibilidades de se passar determinada parte do jogo, antes o jogador era muito travado, podendo seguir somente de uma ou duas formas agora houve um aumento significativo dessas possibilidades.

A Plague Tale: Requiem finaliza a história do irmão de Rune de forma fenomenal, é cheio de emoção toda a investigação e o enfrentamento da realidade exposta, o enredo tem bolas para sair da mesmice e apresentar algo mais real e doloroso, mas não menos necessário.

Pensando no escopo o primeiro ato, - que é basicamente o começo do jogo até a fuga da cidade Provença e a separação dos dois da Mãe e do Lucas - é demasiadamente chato, a apresentação das mecânicas é porca e o nível de dificuldade para o momento inicial do jogo é muito grande, rememorando as partes mais difíceis do jogo o primeiro ato é difícil de não ser citado. A chatice se dá principalmente pela falta de objetivo, tudo que o jogador faz é meio bobo e o ato serve para a criação de uma intriga e desavença entre a mãe e os filhos, isso poderia ser feito de uma forma mais suave e menos enjoativa, além disso a única coisa que se leva do primeiro ato é o personagem Arnud, que esse sim tem grande relevância para a história do jogo.

Um novo elemento que foi adicionado ao jogo e que me impressionou com a inovação se comparado com o primeiro jogo, foi o elemento de investigação, ao chegar na ilha e tentar descobrir as significações do sonho do Hugo e as relações com a ilha tem-se esse elemento investigativo muito presente que sai daquela narrativa direta presente no primeiro jogo, a inovação é bem quista e ateia fogo a toda monotonia presente no jogo até aquele momento.

A mácula que é sempre referida como algo hereditário e ligado ao passado tem sua representação na antiguidade na praga de Justiniano, a peste bubônica, essa referência é interessante e enriquece bastante a história como um todo. A relação de sangue está presente pelo descobrimento do passado do antigo portador e da sua protetora, há uma relação direta entre eles e Amicia e Hugo, então a relação de sangue aqui é dada de forma horizontal e vertical, vertical em relação ao passado e horizontal em relação aos irmãos.

A proposta do enredo do jogo pretende introduzir a história da destruição da família de Rune, a luta pela sobrevivência dos irmãos de Rune, a Amicia e o Hugo, e termina com a superação da crise que assola a vida da família. O interessante da história é o recorte do tempo proposto, a França no ano de 1348 onde se tem o ápice da peste negra na Europa, e o jogo genialmente propõe a ressignificação da peste negra como o Background da obra.

Essa ressignificação da peste negra se dá pelo fato dos ratos não mais só transmitirem doenças para as pessoas, mas serem reais assassinos, devoradores de carne humana. Aparecendo aos milhares e sempre junto com a putrefação do ambiente onde são inseridos, os ratos são um dos principais inimigos dos protagonistas do jogo, o outro antagonismo se dá pela inquisição que persegue o filho mais novo da família de Rune, com intenções secretas, pelo menos em um primeiro momento. Esses dois adversários criam uma atmosfera tensa durante todo o jogo, sempre há um inimigo ou outro para se deparar e tentar sobreviver desse embate.

Todo o enredo é muito bem embasado, os motivos para acontecer a invasão de ratos é explicado pela procura desse mal pelo o portador da mácula, que no caso é o Hugo que possui esse poder obscuro herdado pela linhagem sanguínea. E o motivo para a inquisição perseguir os irmãos também é embasado na vontade do Grande Inquisidor em adquirir o sangue do portador da mácula para que ele também possa controlar os ratos e ter um exército imbatível ao seu dispor. O ponto aqui, é que a história não deixa pontas soltas, em tudo há um motivo, seja de cunho pessoal ou místico.

A ideia da mácula em si como o grande segredo que permeia toda a história e é o cerne de todos os acontecimentos tem seu grau de credibilidade aceito com certa facilidade. Não é difícil ter uma suspensão de descrença ao entender ela como um traço hereditário presente nas diferentes gerações da família de Rune.

O interessante é a relação de sangue presente no jogo, a mácula do Hugo é um elemento que advém do sangue, da hereditariedade é o elemento material da obra, e o grau de parentesco que advém da família que compartilha o mesmo sangue, o mesmo gene funciona como elemento moral da obra, que perpassa pela construção das personagens. O ponto é que a relação de sangue é o cerne da obra, seja em relação a mácula, seja em relação a família, é ela que movimenta a história do jogo.

Há um antagonismo claro e clichê, entre a escuridão e a luz, os ratos que representam a escuridão, o poder da mácula, das trevas não suporta a luz, apesar de não ser nada inovador não apresenta pontos negativos escancarados, é apenas ok se utilizar dessa mecânica já consagrada nos diferentes títulos de diferentes gêneros.

Pensando sobre as sensações que permeia a obra, ela são produzidas pelo enredo e pelas mecânicas presentes no jogo, há uma certa angústia com toda a reviravolta que acontece na vida dos Irmão de Rune, a perda da casa, dos pais e de toda a vida que eles tinham até o momento, além disso há certo desespero presente durante quase toda a obra, com os ratos presentes em vários momentos e a ameaça da inquisição sempre estando perto do jogador, ainda há o sentimento de temor que é proporcionado pelo gênero Stealth Game, onde o jogador sabe que se for pego, acabou para ele, então há sempre esse temor de ser descoberto, a tensão permeia por quase toda a obra.

A construção das personagens é fantástica, apesar de serem irmãos há um distanciamento entre ambos, embasado pelo enredo, o isolamento do Hugo durante toda a vida por sua suposta doença, os irmãos quase não se viram durante toda a vida, até o dia D. Logo, há muito espaço para se construir essa relação de irmãos entre ambos, é necessário confiança, respeito e paciência, porém isso tudo envolto em um turbilhão de acontecimentos traumáticos torna essa construção muito mais complicada, principalmente considerando a idade de ambos, Amicia uma adolescente tendo que cuidar e proteger um irmão pequeno de 5 anos que nunca saiu de seu próprio quarto. Esse cenário conturbado é bem trabalhado pela Asobo Studios, conseguindo fazer uma construção gradual da relação de irmãos, sem saltos, sem forçação de barra, tudo é feito em um tempo determinado.

Ainda pensando na construção da personagem, a Amicia tem uma construção interessante ao ir para o lado da alquimia, é uma sacada interessante do título utilizando outro elemento comum a época onde se passa a história do jogo. Como alquimista ela ainda segue os passos da mãe e está diretamente ligada às mecânicas do jogo.

Em relação às mecânicas do jogo, se baseia nas mecânicas básicas de um Stealth Game, onde se tem que esconder da inquisição e se tem um lado mais ligado ao Puzzle game, quando tem-se que livrar dos ratos no caminho. A parte interessante é que a possibilidade de diferentes jogabilidades aumenta durante o jogo na proporção que Amicia aprende novas fórmulas de alquimia, ou seja, ao decorrer do jogo há várias formas de se passar pelos inimigos, seja os distraindo, matando ou lurando para armadilhas, há bastante diversidade de gameplay ao longo do jogo. Ainda há as mecânicas de batalha com certos “chefões” que são básicas de um adventure game, é necessário realizar a mecânica 3 vezes em cada um deles e ao fazer isso eles são derrotados.

Falando sobre a ambientação é um trabalho fantástico da Asobo Studios, o jogador ao jogar a obra se sente dentro da França em 1348, principalmente ao se considerar os ambientes das cidades das vilas, os ambiente são muito ricos em detalhes e são muito cuidadosos com os elementos que precisam estar presente neste período de tempo, isso ainda é amplificado com gráficos maravilhosos de tirar o fôlego.

A estética se utiliza do realismo, o que aumenta as diferentes sensações disponibilizadas pela obra, toda angústia, desespero e temor é aumentado e muito pela estética realista.

Concluindo, A Plague Tale: Innocence é uma obra fantástica onde a Asobo Studios consegue criar uma história bem embasada, com diversos elementos que se comunicam muito bem entre si e ainda há um cuidado gigantesco com a ambientação e com os detalhes gráficos presente no jogo. Sem se utilizar de inovações mirabolantes, tendo um foco na história e na ressignificação de um desastre da história da humanidade, a obra apresenta uma experiência avassaladora para o jogador.

Após o fechamento de um ciclo com o God of War: Ascension, a Santa Monica Studio lança uma nova história de Kratos, o desvinculando da mitologia grega e ligando-o à mitologia nórdica, apresenta um Kratos cheio de remorso que agora tem um filho para criar e educar.

Pensando sobre o escopo da história de God of War, é, ao meu ver, uma proposta simples demais e que foi extremamente bem trabalhada. Um pai e um filho realizando o último desejo da mãe, levar suas cinzas para a montanha mais alta. Esse escopo por ser bem pequeno e específico dá a possibilidade de explorar bem essa jornada, adicionando vários imprevistos e contratempos, além de realizar um construção minuciosa das personagens e ainda sim, sem perder o objetivo principal que é atingir o pico mais alto. A Santa Monica Studios faz isso com primazia, eles conseguem desenvolver uma história envolvente, extensa e carregada de plot’s sem perder o objetivo inicial.

Uma parte bem importante quando se escolhe a mitologia nórdica como plano de fundo dessa história é conseguir explorar essa mitologia profundamente sem deixar os jogadores perdidos nela, God of War consegue muito bem fazer isso, as informações são dadas de diferentes formas, seja pela história contadas por Atreus, Mimir, ou as plaquetas encontradas por todo mundo com recados das figuras mitológicas. O jogador nunca está perdido na história, mesmo que o conhecimento do mesmo sobre a mitologia nórdica seja ínfimo. Além disso, essa estratégia de apresentar as informações fragmentadas combina com a forma real de como é apresentado a mitologia, ela sempre é fragmentada, com contos e acontecimentos pontuais, a história não é quase nada linear.

Um ponto importante no título é como inserir Kratos nesse universo mitológico e torná-lo relevante, principalmente considerando esse sincretismo que é necessário para dar sentido a história. Essa inserção é dada de forma básica, nada muito chamativa e a importância no universo das personagens de Kratos e Atreus é aumentada de forma gradual, que combina muito bem com as bases de RPG’s colocadas no jogo no que diz respeito a montagem de build, conforme as personagens vão se tornando relevantes e inimigos poderosos vão aparecendo a evolução da personagem caminha em conjunto.

A progressão da história é muito bem empregada, não há saltos na história, mudanças bruscas de personalidade das personagens, as mudanças são graduais acontecem aos poucos, a mudança nunca é brusca e sem sentido.

A construção das personagens aqui é fantástica, Kratos com um passado “desconhecido”, carregado de remorso por perder sua amada e distante do filho adolesnente, e um garoto, “Atreus” que fora doente durante muito tempo e que agora deve viajar com o pai não muito amoroso, pelo menos em um primeiro momento, para honrar o último desejo de sua mãe. A mudança das personagens desse recorte inicial para o fechamento da história no topo da montanha em Jotunheim é drástico, as personagens saem desse afastamento e constroem uma relação mais amorosa e mais próxima do ideal ao longo da jornada. O mais interessante é que essa construção é gradual, partindo desse estranhamento mútuo, até a doença do Atreus atacar, a revelação de Kratos como Deus, a soberba subindo a cabeça do garoto e ele retornando para um posição moral mais alinhada com a do pai, enfim, a construção dessa relação de pai e filho é uma segunda camada que é muito explorada o jogo todo e traz um elemento que carrega a história de significações que vão além da jornada até Jotunheim.

O interessante que esse elemento da relação entre pais e filhos não está presente somente na relação de Kratos e Atreus, ela também está presente na relação entre Freya e Baldur, o ponto chave é a ambiguidade das relações entre ambos, enquanto o primeiro tenta uma aproximação, a construção de uma confiança e o respeito, a segunda relação já está destruída a muitos invernos e está na tentativa de reconciliação que parece impossível de acontecer. Essa ambiguidade apresentada traz a relação de pais e filhos como elemento importante na construção de todo o processo vivenciado pelo jogador, apresentando as dificuldades vivenciadas e a superações que devem ser enfrentadas.

Outro ponto muito bem trabalhado pela Santa Monica Studio é uma “comparação” entre Kratos e Tyr, os dois deuses da guerra porém de mitologias diferentes, a ideia de Tyr como amigo de todas as raças e que acreditava que a força levava a paz é um completo oposto de Kratos que dizima o panteão grego, então, considerando a importância de Tyr no enredo do jogo e a discrepância com Kratos é interessante como é apresentado esses dois lados da Guerra, um lado que busca a paz e outro que leva a destruição.

A jogabilidade se comunica muito bem com enredo, por exemplo, no momento que Atreus descobre que é um Deus e começa a agir com arrogância, o jogador não consegue mais comandar o garoto, ele age por si mesmo, esses pequenos detalhes trazem uma sintonia muito grande entre a jogabilidade e o enredo. Essa mecânica derivada de um soulslike, com cada inimigo sendo um desafio, a importância de mecânicas como aparar e desviar dos golpes, torna a experiência de jogo mais impactante, até por que o foco constante é necessário para realizar esse tipo de combate, e se destoa bastante dos outros títulos da franquia que tinham uma pegada mais hackslash.

Outro ponto da jogabilidade que vale a pena ressaltar, são os elementos de rpg presente no jogo, a construção de uma build torna a experiência mais dinâmica e menos engessada, uma pedida bem interessante em jogos de longa duração como God of War, diferentemente dos títulos anteriores que não apresentavam nada dessa proposta.

As quests secundárias são bem divertidas e complementam bem a história, não são demasiadas para roubar o protagonismo da missão principal e cumpre bem o seu papel, principalmente porque através delas é apresentado o reino de Niflheim e Muspelheim.

A escolha estética pelo realismo segue a ideia base dos jogos anteriores, que negavam o cartoon e tentavam tornar tudo mais visceral utilizando o realismo, bem interessante a escolha considerando que se queria ressaltar todo o sangue, morte e destruição de um Deus chacinador. Essa proposta continua presente no novo God of War(2018) e traz consigo uma qualidade ainda maior do realismo, com as atualizações do motor gráfico e utilizando um novo nível de tecnologia, a obra apresenta um realismo insano se comparado com os jogos anteriores. Em relação ao cenário é fantástico a ambientação, os ambientes são gigantescos e muito bem trabalhados, todos ricos em detalhes que levam a ideia de exploração a um novo nível se comparado com os títulos anteriores.

Em relação aos pontos negativos, tem-se uma certa limitação a variedade de inimigos, são todos muito parecidos e não há quase nenhuma mudança entre eles, o maior problema disso é o distúrbio na ambientação, já que não adianta cenários variados e os mesmos inimigos o tempo todo. Outro ponto negativo é a utilização do visco para ser a fraqueza do Baldur, funciona como um Deus ex machina, é muito cômodo para o enredo utilizar isso como a fraqueza do Deus, enfim esse ponto poderia ser melhor trabalhado pelos desenvolvedores.

Concluindo, God of War consegue trazer novos ares a uma franquia consolidada mudando a gameplay e a transportando a história para um novo background mitológico, trazendo ainda uma construção de uma relação paternal em um escopo simples e bem desenvolvido que é a jornada até a montanha mais alta. Sem se perder tentando fazer algo inovador, utiliza sistemas já consolidados de jogabilidade e design, apresentando assim uma obra sólida e concisa. Difícil falar que é uma surpresa pois já se espera um grande trabalho vindo da Santa Monica Studio e da Sony.

Stardew Valley, desenvolvido pela ConcernedApe propõe no escopo da obra um universo de simulação da vida de um fazendeiro, o diferencial é a complexidade e a abrangência desse mundo, trazendo para a obra diversas situações que estão presentes na vida comum.

A história de Stardew Valley se passa pela aquisição de uma fazenda como herança deixada pelo avô do jogador, e com essa fazenda ele poderá levar um vida mais calma no campo, longe da cidade, o personagem poderá viver da terra. Na fazenda, a vida comum de um fazendeiro precisa ser levada, plantar, colher, criar animais e produzir produtos manufaturados, até aí não há nada de surpreendente no jogo.

O diferencial aparece o que está além desse simulador de fazenda, apresentando um simulador da realidade com diferentes npc’s e as relações que o jogador tem com eles, cada npc tem um história de vida, um passado, aspirações e desejos, cada um deles é vivo dentro jogo, não são somentes alavancas para a história do jogo. Essa humanização dos npcs e os eventos que acontecem no vale do orvalho levam o jogador a criar um senso de pertencimento com essa comunidade. O jogador vai entendendo os sonhos desses personagens e conforme vai se criando intimidade com eles é possível adentrar dentro da vida desses personagens e ajudá-los a superar problemas e aflições. Outro elemento que aumenta esse senso de pertencimento do jogador são os eventos que acontecem 2 por estações, onde a comunidade se junta para celebrar, agradecer e realizar atividade em conjunto, cada um desses npcs se tornam parte da vida diária do jogador quando este está jogando Stardew Valley. Há diversas decisões morais para serem tomadas quando se convive com esses npcs.

Os sentimentos em jogo de simulação de fazenda se dá pelo relaxamento e pelo exploração dos diferentes sistemas envolvendo essa simulação, como Stardew Valley propõe uma simulação da vida real, os sentimentos de pertencimento e comunidade passam a ter grande relevância e aí cabe analisar como ele são gerados pela obra.

Para um jogo na temática de simulação funcionar ele precisa se aproximar da realidade o máximo possível, e a parte mais difícil de criar um ambiente real são as relações sociais e os aspectos morais, Stardew Valley constrói isso através de um ambiente de relações entre o jogador e os npc’s criando o sentimento de pertencimento para com essa comunidade do Vale do Orvalho. O pertencimento chega ao ponto de o jogador poder se casar com um dos moradores solteiros do vale do orvalho e ter um filho com eles, tornando parte ativa da comunidade até com seus descendentes.

Além desses fatores de pertencimento que prendem o jogador ao jogo e o torna íntimo com o ambiente e as pessoas que o cercam tem ainda um fator místico envolvido ali, onde se tem monstros, magos e bruxas. A exploração da mina é um exemplo onde se enfrenta monstros e há uma fuga da realidade apelando para o surreal. Isso tira a monotonia do jogo e o torna mais dinâmico até por que adiciona afazeres que diferem da vala comum da vida de fazendeiro.

Um grande detalhe é que o jogo deixa as rédeas do destino com o jogador, um dos pontos importantes do jogo é a escolha do jogador reformar ou não o centro comunitário, caso ele reforme a comunidade se une para boicotar a loja joja e permanecer com senso de comunidade deles, caso não seja reformado a loja joja compra o centro comunitário e o transforma em um armazém, o jogador vira sócio dessa corporação onde ele trabalhava no começo do jogo.

A obra surpreende ao jogador apresentando um aumento do escopo ao longo do jogo, quando o jogador acha que chegou ao fim do escopo ele aumenta novamente, há novos lugares para explorar mesmo depois de horas de jogo, como o deserto ou a ilha gengibre que está disponível depois do segundo ano.

Apesar de Stardew Valley não ter um final, você sempre pode continuar vivendo nesse mundo até quando quiser, um possível final acontece no final do 2 ano indo para o 3 quando o avô do jogador aparece e diz que está orgulhoso de tudo que ele fez até agora e por ele ter honrado o nome da família, esse é considerado como o “fim” para um grande número de jogadores.

A gameplay é bem dinâmica e extensa, há várias coisas para se fazer em um dia e não há tempo de fazer todas, logo tem que escolher as prioridades, seja matar monstros, pescar, cuidar de animais, ou concluir missões. A dinamicidade é presente em todos esses aspectos, até na montagem do personagem onde se masteriza as habilidades de coleta, plantio, combate, pesca, etc. Com isso abre-se novas opções para explorar o mundo, por exemplo com a evolução da maestria em pesca é possível construir armadilhas de pegar peixe e mudar a forma como se pesca.

A arte do jogo é fantástica, é um 16 bits muito bem feito com bastante detalhes, e como um bom jogo cartoon, apela para o surrealismo direto e o faz com maestria, trazendo elementos fora da realidade para fazer parte desse universo fascinante.

Concluindo, Stardew Valley traz um novo conceito de fazendeiro, com diversos elementos de simulação da vida de um homem da terra, apresentando ainda uma construção de build tornando a ideia do rpg presente no jogo. Essa parte já é fantástica em si, porém o mais impressionante é o que há além dela, a atmosfera do jogo, a sensação de um mundo real onde é possível viver diversas experiências de relações humanas, onde é necessário fazer escolhas de cunho moral diversas vezes, onde é preciso personificar esse personagem e viver uma vida no campo.

Chronicon é um ARPG Hack Slash que utilizando gráficos de 16 bits, - algo bem diferente considerando o gênero ARPG - segue os passos de títulos consagrados, como Path of Exile e Diablo.

Pensando em um jogo no estilo ARPG Hack Slash há quase sempre um grupo de sentimentos em comum que é transmitido por esse tipo de obra, o sentimento que é mais comum é o de dominação, geralmente os ARPG’s apresentam sempre um grande número de inimigos sendo dezenas deles fracos e alguns pontualmente mais fortes e desafiadores, tirando o boss é claro, então, por sempre o personagem do jogador ir passando pelo mapa e matando esse grande número de inimigos como se não fosse nada tem-se a sensação de dominação, como se o jogador é super poderoso e todos ali são inferiores a ele. Outro característica do gênero é o sentimento de relaxamento ao jogar, os inimigos nesse tipo de jogo não são muito complexos, são simples e na maioria das vezes fracos, então entrar nesses mapas procedurais e matar um grande número de inimigos utilizando diversas habilidades graficamente maneiras é outro motivo da popularidade do gênero. A última característica, mas não menos importante é o desafio, nesse modelo de jogo, tende-se a atender certa base da playerbase ao apresentar desafios para que os jogadores explorem ainda mais as builds, com seus itens específicos, maestria e diversos outros elementos que compõem a build que precisam estar maximizados para enfrentar esses desafios, essa busca pela superação dos desafios é um grande motivador e um sentimento que percorre uma boa parte dos jogadores.

O jogo Chronicon possui todos esses elementos anteriores, e consegue transmitir todos esses sentimentos, os inimigos são simples e nada complexos com detalhes mecânicos que podem matar o jogador, então o sentimento de dominação por obliterar eles está presente em todo o jogo. O sentimento de relaxamento acontece durante todo o jogo, até por ele ser bem intuitivo e não tão complexo, proporcionando um boa experiência sem o jogador ser obrigado a explorar a parte de encantamento, gema e melhoria de equipamentos, o gráfico de 16 bits torna tudo ali mais leve e despreocupado, com certeza Chronicon transmite essa sensação de Chilling game. Os desafios estão presentes em um endgame grande e desafiador, tanto no jogo base quanto na DLC, então o jogador que deseja desafiar seu personagem e sua build tem essa oportunidade enquanto joga o game.

Em relação a história da obra, Chronicon propõe uma ideia de viagem temporal, o momento presente da história é um momento de paz, conquistada pelos antigos heróis, o objetivo do jogador é conseguir o título de Campeão, para isso ele deve reviver momentos específicos onde os antigos heróis fizeram a diferença, isso são os atos do jogo. O ato 1 é reviver a tomada do templo da deusa Ayella depois da sacerdotisa ser corrompida, o ato 2 é a guerra élfica de 400 anos atrás, o ato 3 é a retomada do castelo que foi tomado por um doutor maluco, o ato 4 é a exploração junto com uma arqueóloga e aventureira, e o ato 5 é última guerra contra os demônios. O escopo da obra não é grande, e como ela traz essa ideia de reviver acontecimentos passados, abre-se um leque para a construção de história pontuais e que não tem ligação entre si, como a guerra élfica a exploração no ato 4, então, esse histórias pontuais que poderiam ser consideradas como um desleixo dos desenvolvedores, não o é, pois a proposta do enredo engloba essa construção pontual.

Falando sobre a jogabilidade, o jogo apresenta 4 classes distintas com cada uma com 4 especializações que podem ser seguidas na build, dando grande variedade de gameplay que é necessária em ARPG, principalmente pensando nos jogadores que gostam de desafio e focam seu jogo no endgame. Há bastante customização da build dos personagens com as especializações, gemas, encantamentos e afins, o jogo tem um construção de personagem profunda e extensa, muito bom para explorar diferentes combos.

Como já dito antes, Chronicon apresenta um gráfico de 16 bits, o que torna o jogo bem mais leve graficamente, com menos detalhes, tornando a sensação de relaxamento, comum nesse tipo de jogo, mais forte. Os cenários apresentados são diversos entre si, e fazem sentido considerando a proposta da história, e essa diversidade diminui a monotonia do jogo e aumenta o interesse.

Chronicon não inova em nenhum aspecto, não há realmente nada de novo se comparado com outros jogos do gênero, porém ele atende aos requisitos básicos de um ARPG moderno com seus elementos de hack slash que dá a sensação de dominância ao jogador, ao mesmo tempo que entretém, ainda possuindo elementos desafiadores para o endgame. O sentimento ao se jogar esse jogo é que ele é mais um ARPG qualquer.

Concluindo, a obra apresenta uma proposta sólida com os elementos comunicando- se muito bem entre si e a estética servindo a proposta do gênero. Mesmo não apresentando inovações não deixa de ser divertido, Chronicon é um jogo OK, não é uma obra que marcará a história dos jogos, mas é uma boa pedida para um fim de semana com tempo livre.

Little Nightmares é um jogo de aventura com puzzle e horror que discute sobre o trauma como um pesadelo e ao revelar o cerne do trauma consegue criticar de forma fenomenal um problema que foi e é o pesadelo de vários.

A proposta do jogo gira em torno de uma menina minúscula que acorda dentro de um navio escuro com um isqueiro, com o objetivo de sair desse lugar, o jogador, controlando essa garotinha, deve superar os obstáculos e inimigos para alcançar a saída. As informações disponibilizadas para o jogador são poucas, o jogo não possui fala, o que é bem comum em jogos de horror, então todas as informações são obtidas através de desenhos nas paredes e deduções. Uma parte da história eu obtive lendo a sinopse do jogo na steam, a personagem se chama Six, 6 em inglês, acredito que seja uma referência a idade onde essa pessoa passou por esse medo, além disso o nome do navio é A Bocarra, que faz sentido com toda a história girando em torno da fome.

O jogo é dividido em 5 “capítulos”, a parte inicial da Prisão, O Covil, com a personagem com os braços gigantesco, a Cozinha com os cozinheiros, o Saguão dos Convidados com a galera comendo e Os Aposentos da Madame com a personagem final. Como o nome do jogo é little nightmares, a ideia proposta aqui é o pesadelo da personagem principal, e ele está diretamente ligado ao trauma de um criança, a fome, que provavelmente foi algo recorrente na vida dessa personagem, e talvez isso seja o mais impactante, a fome é o medo da personagem e ela se personifica como elemento principal do pesadelo, ao perceber isso o sentimento de pena é escancarado ao jogador.

Há diversos elementos presente no jogo referenciam a o pesadelo que essa personagem está vivenciando, o navio em si, está sempre vazando como se fosse algo velho, fazendo referência que este medo é ligado a algo antigo, pelo grande número de crianças na prisão provavelmente a personagem cresceu em um orfanato, a pessoa com os braços gigantes é possivelmente algum cuidador desse orfanato que tratava mal essas crianças e as deixavam com fome, os cozinheiros são gordos e as crianças são sempre magras e isso se intensifica a ver todo um grupo de pessoas gordas comendo e se saciando e a personagem morrendo de fome, além disso há a madame esbelta que não consegue olhar no próprio reflexo, talvez seja uma referência dela não poder encarar os próprios pecados que cometeu, ela possivelmente seria a diretora desse orfanato. Claro que tudo isso são suposições, mas é isso que o jogo instiga ao jogador, que ele crie suas conclusões a partir da obra, essa é a função do público enquanto fruidor da obra de arte.

Esse medo personificado como a fome está presente em todos os capítulos da obra e ele evolui gradualmente durante o jogo, no capítulo um a personagem sente fome e come o resto de comida de outra criança, no segundo capítulo é a comida que os ratos estão comendo, no terceiro capítulo é o próprio rato, no quarto é um dos cabeça de cone que são “amigos” da personagem e no último capítulo é a madame. Saciar a fome comendo o ápice da personificação do medo, a madame, é o indício da superação do próprio medo, por isso a cena final dos gordos se deteriorando, pois o medo não existe mais, ele foi superado e a saída está repleta de luz, quase como o paraíso para a personagem.

Um elemento interessante no jogo é a luz que permeia todo o jogo, sempre havendo lamparinas para acender e elas representando o save do game. Além disso, se tem o isqueiro que a personagem sempre carrega com ela, esse elemento da luz faz sentido por que a ideia do pesadelo acompanha a ideia da escuridão, do sombrio, da insegurança e a luz da segurança, de algo bom e iluminado. É uma sacada clichê que é utilizada, não prejudica a obra em nenhum sentido, mas também não acrescenta muito.

Pensando sobre os elementos de horror, a personagem principal utiliza um capuz amarelo que remete logo às crianças do It, a coisa, é uma referência clara e que já consegue de primeiro momento causar medo. A deformação dos personagens são corroboradas tanto pelo fato de tudo estar dentro de um pesadelo e pelo próprio cartoon enquanto escolha estética. Os elementos do cenário em si não causam medo, não tem nada de tão anormal no cenário, há gaiolas, uma cozinha, livros, enfim diversos cenários, mas nada macabro, diretamente. A música sim, apresenta um elemento vívido do horror, pela falta de falas ela é muito importante para criar a sensação de medo e ela é perfeita nesse sentido, ela a todo momento consegue deixar o clima tenso, sempre esperando-se algo de ruim acontecer, ela que causa a apreensão e o suspense, além disso nos momentos de perseguição, o desespero e excitação são permeados pela música.

A construção da jogabilidade é fantástica nesse jogo, como ele é esse 3D mas que trabalha com a profundidade de 2D, torna-se no fim um jogo de plataforma, mas o interessante são os detalhes que são empregados a movimentação da camera balançando conforme o navio balança proporciona uma sensação de imersão incrível, o jogador sente as mesmas variações que a personagem, Little Nightmare proporciona uma imersão incrível para um jogo de plataforma.

Os elementos se comunicam muito bem entre si, a música e o cenário se casam perfeitamente e estão em total sincronia, os efeitos sonoros de cada elemento do cenário faz a imersão alcançar um novo nível, todos os sentimentos que são necessários em um jogo de terror Little Nightmare proporciona, e ainda, o maior acerto é que a obra consegue discutir sobre o pesadelo que é a fome como elemento principal, uma crítica espetacular sobre o que talvez seja o maior pesadelos de vários adultos que tiveram esse medo quando criança. Então Little Nightmare realiza uma crítica contundente a um problema exposto na realidade, ele ultrapassa a obra, dialoga com a realidade e a crítica.

Deixando um disclaimer logo de início, a crítica a Fortnite é uma crítica unicamente sobre o modo battle royale, o modo salve o mundo é considerado um jogo à parte.

Como a arte está diretamente ligada com as emoções e sentimentos provocados pelas obras, a primeira coisa a se pensar é: o que causa emoção em um battle royale?. Como o objetivo do jogo é a vitória, ser o último sobrevivente seja sozinho ou em equipe, o decorrer desse processo de vitória e o alcance dela que gera as maiores emoções possíveis no jogo, isso se dá pois a cada minuto do jogo que a safe vai ficando menor o sentimento de ansiedade e excitação vão aumentando, e conforme o jogador consegue ficar vivo as emoções se intensificam até o ápice no momento da vitória onde tem-se as emoções de excitação e triunfo. Porém essas emoções proporcionadas pela vitória não são as únicas experimentadas pelos jogadores, a derrota, morrer durante a partida causa frustração, raiva e caso isso seja muito repetitivo o tédio é o ponto final.

Para realmente se experimentar artisticamente uma battle royale é preciso experimentar todas as emoções constantemente e para isso a vitória pode ser rara e ocasional mas não impossível, pois senão haverá uma quebra da experiência do jogador até pelo fato de não ter atingido o objetivo final, o da vitória. Precisa-se de meios para contornar esse problema e eles são implementados no jogo com a adição de bots, quando as derrotas se tornam uma maioria absoluta, talvez essa não seja a melhor solução mas funciona, pelo menos em parte.

Outro ponto importante para a criação de emoções é sentir que toda a experiência vivida faz parte de algo maior, que vai além da inumerável quantidade de partidas que são em sua maioria repetitivas, aí entra o fator da história que se passa no jogo e as temporadas e capítulos que os jogadores vivenciam.

Pensando em relação a história de Fortnite, com certeza é uma história viva, ela acontece a todo momento, a toda partida e os jogadores fazem parte dela de forma direta. A cada semana missões são dadas contando um pouco da história atual que está acontecendo e mudanças sutis podem ser percebidas no mapa, além disso as mudanças das armas e os itens disponíveis no jogo também estão ligados a história e há pequenas mudanças semanais, isso tudo em conjunto é o que torna a história vívida. Geralmente, ao final de certas temporadas, há um evento com grandes mudanças na história e na ilha onde se passa o jogo, com esse evento tem-se a mudança de capítulo, que se dá com a sinalização de vitória dos jogadores sobre as ameaças da ilha de Fortnite, no capítulo 1 do jogo a vitória é sobre o meteoro que atingirá a ilha e no capítulo 2 é a vitória sobre a rainha dos cubos.

Essa missões semanais são os jogadores movimentando a própria história do jogo, o protagonismo é dividido para cada jogador e todos fazem parte de algo maior, essa participação coletiva torna cada mudança de ciclo especial, porque ela dá sentido a todo esforço empregado pelos jogadores nos últimos meses, e o mais importante, esse momento em si é único ele nunca irá se repetir, então aquela se torna uma experiência única e pontual que é de extrema importância para quem percorre a jornada por meses, a experiência artística nesse sentido é algo vívida.

A ambientação e design de personagens cartoon, combinam com as experiências vividas pelo jogador, as loucuras interdimensionais, o surrealismo e as mudanças estéticas frequentes. O cenário alterna constantemente sempre referenciando o próprio jogo e as parcerias que acontecem ocasionalmente, como o clarim diário, na parceria com a Marvel. As diferentes skins fazem parte da própria estética, e são corroboradas pela história multidimensional do Fornite, elas dão um ar único ao jogo, o diferenciando dos outros jogos do mesmo gênero.

Agora, falando sobre a construção, ela é mais uma herança do modo salve o mundo - que é a ideia inicial do jogo - do que uma proposta que faz sentido com modelo proposto. Fortnite utilizava essa mecânica como um elemento único que o diferenciava de outros jogos, por diversos fatores essa mecânica se tornou um empecilho para a retenção dos jogadores e finalmente no ano de 2022, tem-se a opção de se jogar sem ela, é uma grande adição e que realça os outros elementos que tinham menor visibilidade pelo excessivo foco nessa mecânica que tornava o jogo singular.

Adentrando a parte competitiva, que torna o Fortnite um dos ditos Esports, ou um esporte eletrônico, ela tem sua importância para sustentar o jogo dentro do meio das competições, que definitivamente atraem mais jogadores. Porém, a grande maioria dos jogadores estão cativados pelas experiência vividas ao se jogar o jogo em si, do que ao assistir as competições. Essa modalidade que às vezes rouba o holofote do jogo, deve ser sempre lembrado pelos desenvolvedores que é um elemento secundário dentro do universo do jogo. Os desenvolvedores de Fortnite mantém isso em mente e colocam isso em prática constantemente, facilmente percebido pelo zelo com a obra que eles construíram.

Fortnite apresenta uma história rica, complexa e viva, que prende os jogadores ao longo das semanas para chegar a desfechos pontuais cada final de temporada, além disso essa história viva que influencia em cada partida individualmente faz com que ela seja impactante até para quem deseja ignorá-la, e tudo o que ocorre em cada momento de cada partida está embasado em algo, nada é solto. E ao analisar os sentimentos que isso gera, a produção dele é garantida com um game designer inteligente que estimula a interação do jogador com a história. E ainda, ele consegue, com maestria proporcionar a ansiedade durante a luta pela sobrevivência em cada partida e a alegria e o triunfo por cada vitória.

Midnight Fight Express propõe a utilização das mecânicas clássicas de jogos do estilo Beat 'em up porém adicionando particularidades interessantes, com esse pretexto a obra pretende nos contar uma história misteriosa, eletrizante e revoltante.

A modelagem da jogabilidade proposta por Jacob Dzwinel remete aos clássicos jogos do gênero Beat 'em up, porém abrindo mão do 2D que é tão marcante no gênero e se utilizando um 3D moderno que por ser bem implementado não fere o legado desse estilo tão marcante.

A grande diferença na proposta de Dzwinel é o grande foco na história do jogo que concorre com o protagonismo da mecânica de luta. Os dois são importantes, eles dividem a titularidade do cerne da obra, se complementam mutuamente, e essa ideia por ser muito bem implementada faz surgir algo único e inovador pelas mãos dos desenvolvedores.

A história presente no jogo é cheia de reviravoltas, há sempre segredos e mistérios rondando tudo o que ocorre na obra e as revelações são apresentadas em doses pequenas e constantes, prendendo a atenção do jogador durante toda a experiência do jogo. Outro ponto interessante de citar na história, é a sua divisão em atos que torna a sensação de progressão muito mais fluida, o jogador sabe o que esperar em cada ato, uma apresentação, um desenvolvimento e uma conclusão.

Dzwinel consegue criar um enredo inesperado em vários momentos, em momentos pontuais, um humor alegórico, como na fase dos desenvolvedores que está diretamente ligado com a produção do próprio jogo, uma espécie de quebra da quarta parede, outro momento inesperado são os plot twist’s que conseguem brilhantemente despertar diferentes sentimentos no jogador, ódio, raiva, desprezo tudo isso direcionado para o vilão. Falando no vilão sua construção é fantástica, tudo sobre ele é idealizado vagarosamente, como: as diferentes camada de seu plano maléfico, as influências que ele possui na cidade do amanhã, até mesmo seu nome é uma construção gradual, tudo isso vai alimentando a figura vilanesca que é apresentada no final do jogo. O enredo apesar de não ser complexo na ideia inicial, um chefão do crime tentando tomar a cidade em uma noite, tem em suas entranhas ideias fantásticas que são trabalhadas ao longo da obra. Dzwinel mostra que não é sobre a história em si, mas como ela é trabalhada.

A relação de pai e filho apresentada pela história é uma relação distante, porém faz sentido ela ser distante, os dois não conviveram tanto tempo juntos e foram separados algumas vezes durante a vida, então, essa relação destoante apresentada é justificada pela história. Uma outra crítica negativa é a figura da personagem da mãe, a boss Arlenda, ela não cumpre nenhum papel relevante e sua adição é desnecessária, para se tornar uma personagem relevante ela deveria ter um papel mais importante na vida do Cara de Bebê e do Droninho, além disso deveria ser apresentada como um das grandes vilãs, porém ela é só uma contrabandista de arma, o terceiro boss do jogo.

Mecanicamente, a proposta dos desenvolvedores são até certo ponto inovadoras considerando o gênero em si, porém não inovadoras considerando o mundo dos jogos. O game designer utiliza a ideia do esconderijo para criar um ambiente intermediário que permite o controle do personagem do Carinha de Bebê, essa ideia difere bastante de outros games beat 'em up. As habilidades apesar de serem inerentes ao personagem - até por que o jogador consegue liberar todas elas ao final do jogo - necessitam de escolhas, sobre o que priorizar na árvore de habilidades, e assim o jogador acaba criando um estilo próprio para ele, pois se ele foca em evoluir as habilidades de agarrão ele tentará utilizar isso ao máximo nas fases, isso acaba criando um estilo de combate único para cada jogador.

Há uma grande variedade de formas de se lutar no jogo, arremessar itens, utilizar armas brancas, armas de fogo e os diferentes estilos de combate, esse junção dá viabilidade a diferentes gameplays, e o mais interessante é que o jogo propõe que o jogador use a maior quantidade diferentes de estilos de combate que ele puder, pois o jogo recompensa ele por isso, utilizando um sistema de pontuação no final da fase que é baseado na variedade de formas como o jogador matou seus oponentes, ou seja, o jogo instiga os jogadores a tentar sempre algo novo, algo diferente do habitual.

A parte mais competitiva do jogo pode agradar a uma player base que busque desafios, o tempo para concluir cada fase e os desafios presentes nelas incentivam os jogadores a refazer as fases e tentar superar a si próprio. Isso também funciona como mecanismo de retenção de jogadores.

Esteticamente a obra ambienta uma cidade gigantesca com vários cenários diferentes e bem modelados, com detalhes que compõem muito bem o cenário como um todo, o estilo geométrico dos personagens se destaca do ambiente gerando um contraste necessário em um jogo beat 'em up onde a localização dos inimigos é importante. A escolha estética além de ser boa, serve diretamente como suporte aos outros elementos da obra, criando uma unidade imprescindível.

A música definitivamente tem um papel importantíssimo no jogo, ela integra diretamente o grupo de elementos que impactam e geram sentimentos diversos no jogador. Esse impacto é gerado pela batida forte e contundente no começo de cada fase, a música não é gradual, a batida é impactante logo no início como se fosse um tiro de uma pistola numa corrida de cavalos, esse impacto eletriza e desperta o jogador para o combate, ele é ponto inicial para começar essa briga de rua que vale tudo. A composição musical de Midnight Fight Express complementa a proposta de forma fenomenal.

Concluindo, Dzwinel em sua proposta onde eleva a importância da história, consegue criar uma obra que extrapola o escopo clássico de um jogo do gênero Beat 'em up, assim, dá vida a algo ímpar, contendo uma unidade artística sólida onde seus elementos trabalham em conjunto para oferecer uma experiência exuberante que faz transbordar um mix de sentimentos conflitantes que são desejados em experiências artísticas.

Enquanto um jogo do gênero rouguelite Curse of the Dead Gods apresenta uma unidade sutil dos elementos que compõem a obra, porém com uma conclusão que serve demasiadamente à jogabilidade, e quase nada ao enredo.

O enredo de Curse of the Dead Gods discursa sobre um aventureiro chamado Caradog McCallister explorando o templo do deus da morte, dentro desse ambiente há três deuses aprisionados pelo deus da morte Xbeltz'aloc, os deuses são: T'amok’, o deus jaguar da guerra e do fogo terrestre, Yaatz a deusa águia do céu e da tempestade de fogo e Sich'al a deusa serpente da visão divina e da percepção. O objetivo do jogo é destruir o próprio deus e conquistar esse templo.

Este enredo não é explicitado logo de cara, são poucas informações e elas são dadas ao longo do jogo quando o jogador consegue desbloquear as páginas do bestiário. As páginas têm informações limitadas e são geralmente trechos de história perdidas e sem muitas conexões. Fica claro que a história está em segundo plano no jogo, ela não é cerne da obra, porém essa forma como ela é posta, sempre em fragmentos, e meio dispersas faz sentido com a proposta do jogo, o personagem é um explorador, as informações devem ser garimpadas e descobertas aos poucos e nada é claro e conciso. É uma sacada bem interessante que ao deixar de lado esse lado do enredo ainda compõem uma unidade com a proposta da obra.

Para entender o enredo há um certo esforço do jogador ao compor os pedaços de história soltos e isso gera a imersão com esse personagem explorador. O interessante é que esse personagem não possui falas, isso o torna distante do jogador, não é nada intimista. Talvez isso funcione com a ideia de o jogador, ao morrer, ressuscitar no começo do templo, a morte da personagem é banal pela distância que é criada entre ela e o jogador, que se inicia na falta de um nome para a personagem.

O Rouguelite enquanto gênero recebe diversas características do roguelike mas adiciona algumas ideias próprias, a proposta do hack slash, e a dos itens permanentes, apesar da clássica morte permanente. Curse of the Dead Gods apresentado esse gênero que a grosso modo se importa bem mais com as mecânicas e com os desafios do que com a história, obtém certo êxito nesse quesito menos importante, pois a obra utiliza a história para corroborar as mecânicas clássicas do gênero.

Pensando na mecânica de ressurreição, ela tem sua base no próprio deus da morte que brinca sadicamente ressuscitando o jogador infinitas vezes para que ele tente novamente completar o templo, logo essa mecânica da ressurreição, do repetimento constante do caminho para tentar superá-lo que é uma ideia básica do rouguelite é corroborada pela história do jogo.

Outro ponto que a mecânica tem ligação com a história é nos atributos: constituição, destreza e percepção, cada um ligado a uma cor e a um deus. A constituição ao deus jaguar e a cor vermelha, a destreza a deusa águia e a cor azul e a percepção a deusa serpente e a cor verde. Além disso as bênçãos também estão ligadas ao deuses seguindo as ideias de cores, as bênçãos vermelhas ao deus jaguar, as azuis a deusa águia e as verdes a deusa serpente. Como na história esses deuses estão aprisionados pelo deus da morte, faz sentido ele ajudar o jogador a superar os templos, matar o deus da morte e assim eles poderem ser libertos. Novamente a história, servindo a mecânica do jogo.

Não é somente a história que trabalha para as mecânicas do jogo fazerem sentido dentro do contexto da obra, a ambientação também faz parte disso. O templo, um lugar sombrio, repleto de monstros que já foi desafiado por vários outros aventureiros, esse ambiente por ser um templo e estar ligado ao divino, deverá ter relíquias com poderes sagrados e por ser explorado incontáveis vezes por diversos exploradores deverá ter diversas armas utilizadas que foram abandonadas pelo caminho durante a exploração, além disso como uma ambiente dominado pelo deus da morte, a iluminação é necessária como uma antagonista básica a personificação da ideia da morte: escura, fria e traiçoeira, diferente do fogo que é luz, quente e confortável. Com essas ideias é introduzido diferentes mecânicas que fazem parte do jogo, o próprio ambiente dá sentido às mecânicas disponibilizadas.

As mecânicas são a base de todo roguelite, são elas que são o ponto chave, o cerne, o verdadeiro protagonista da obra. Dito isso, ao analisá-las ela propõem um conjunto grande de influências em cima do gameplay base do hack slash, do desvio, e do bloqueio, utilizando iluminação, armas, atributos, corrupção, bênçãos, favores divinos e relíquias. Essas influências advém de diferentes lugares, como já citado antes. As diferentes mecânicas que compõem o jogo em um primeiro momento parecem extremamente complexas e vão se tornando de fácil entendimento ao longo do tempo, porém esses afloramentos que influenciam na gameplay base, mascaram um problema crônico do jogo, a simplicidade dessa mesma gameplay base. Essa simplicidade é um fator que pode destruir a experiência ao jogar um roguelite.

O roguelite enquanto jogo, tem como pontos essenciais os desafios e a superação, quando se trata da experiência do jogador, isso que o torna emocionante, a sensação de superação, de conquista, e quanto mais difícil é o jogo mais gratificante é essa sensação. Claro, os desenvolvedores têm que ter em mente os limites de dificuldade que eles mesmos propõem para não desestimular os jogadores com fracassos constantes. A linha é tênue porém ela precisa ser precisa, esse é o ponto chave de uma obra desse estilo.

Os inimigos apresentados são simples mecanicamente, tantos os mobs normais quanto alguns bosses, sempre com ataque simples e muito fácil de se desviar, até alguns monstros para o final do jogo, como o dark avatar da serpente, o boss chega a ser ridículo de tão simples que é enfrentá-lo, até mesmo o boss final não é um grande desafio.

Além desse problema apresentado, tem um problema diretamente ligado à conclusão do jogo, ao enfrentar o campeão do deus da morte, o último boss do game, e zerar o jogo, pelo menos teoricamente, a cinematic para conclusão serve diretamente a mecânica, ao se matar ao invés de aceitar ser dominado pela máscara e assumir o posto do novo campeão o jogador volta ao começo ao começo do tempo. Isso serve diretamente a ideia mecânica de o jogador poder continuar fazendo as expedições e não simplesmente assumir a posição do novo campeão do deus da morte, porém, ao pensar nisso a solução para o impasse da história não existe, por que os deus continuarão ajudando o explorador se não há somente duas soluções e nenhuma salva eles? e ainda a falta da possibilidade de escolha no final gera uma sensação de obrigação ao permanecer nesse loop para sempre, há uma sensação de derrota, mesmo após a vitória, o problema é que essa derrota é imposta.

Esteticamente o jogo é bonito, o cartoon para lidar com temas sombrios permite uma surrealidade natural que é comum nos cartoons em geral, logo a escolha é assertiva. As linhas mais grossas dos desenhos torna tudo mais definido, e serve bem ao propósito mecânico da delimitação de espaço dos objetos, tornando mais fácil desviar dos ataques, skills e armadilhas do jogo.

Um detalhe legal é as próprios itens permanentes, a ideia da caveira de cristal, faz uma referência ao clássico indiana jones e casa com a ideia do explorador, e o anel de jade se liga a parte mística mais oriental e a cultura do jade como detentor de poderes místicos. Essas duas referências fazem bem a ideia da obra como um todo.

Concluindo, Curse of the Dead Gods, consegue ter uma unidade enquanto um obra com todos seus elementos funcionando em conjunto, apresentando esses elementos como um forte suporte para seu carro chefe, porém a obra se perde no cerne de sua proposta e empurra goela abaixo um final desgostoso que trabalha unicamente para a mecânica do jogo e não para a conclusão de uma obra.

It Takes Two, o mais recente trabalho da Hazelight Studios que segue, em parte, o modelo de A Way Out, consegue superar em muitos aspectos o seu antecessor espiritual, apresentando uma história extremamente profunda e emocionante que lida com tema sensíveis de maneira lúdica e séria ao mesmo tempo.

O jogo nos conta uma história de um casal que está prestes a se separar e por um desejo inocente de uma criança é colocado em provações para reestruturar o casamento, o título lida diretamente com questões referentes à filha e ao casal em si, mostrando problemas e erros que todos os casais podem cometer.

A progressão da história do jogo é bem trabalhada, as cinematics apresentam um papel importante para a história do jogo, porém não é como se a gameplay fosse somente um intervalo entre as cinematics, como se fosse a viagem entre os locais e o papel de contar a história ficasse por conta das cinematics. A gameplay conta uma história em si, não somente pelos diálogos entre Cody e May mas pelas mecânicas de puzzle que necessitam de colaboração e estão ligadas diretamente com os pontos que necessitam ser trabalhados pelo casal com o objetivo da reconciliação.

A palavra chave que define o jogo é colaboração, ela é a palavra mais enfática do jogo todo, mesmo no momento em que o foco da tentativa de reconciliação transita para temas mais específicos no capítulos finais, como o tema do tempo, atração e paixão, a ideia de colaboração continua presente. Essa colaboração que é extremamente importante para qualquer casal se reflete na própria proposta mecânica do jogo, essa ideia é fantástica por parte dos desenvolvedores, são poucos jogos que comunicam tão bem o enredo com a mecânica do jogo.

A proposta mecânica de It Takes Two segue a de AWO, a tela dividida em duas e a necessidade de dois jogadores para se jogar o jogo, a gameplay é compartilhada entre os jogadores e a colaboração é necessária. A proposta em si é um pouco arriscada pensando na necessidade de se ter alguém para jogar, pois muitos jogadores não tem essa pessoa para jogar ou não querem jogar com ninguém. Porém, essa preocupação é desnecessária considerando a quantidade de vendas que o jogo obteve.

O Puzzle é utilizado para a progressão da história, somente com a sua resolução é possível continuar e progredir no jogo, essa escolha faz muito sentido se pensar no propósito de um puzzle, um quebra cabeça, confuso, desorganizado e que necessita ser arrumado, me parece que essa ideia se comunica muito bem com a ideia de reconciliação.

Essa repetição da mecânica herdada do AWO proposta pela Hazelight gera um pressentimento ilógico em um primeiro momento, esse pressentimento passa pela de ideia de que talvez a reciclagem mecânica fosse demais e os títulos ficassem demasiadamente iguais, principalmente pensando na jogabilidade, mas esse não é o caso, It Takes Two consegue apresentar originalidade mecânica dentro da proposta já dada de seu jogo antecessor.

A originalidade mecânica está ligada à própria proposta da história do jogo, como o jogo se trata de um casal que tenta se reconciliar um dos principais pontos que devem ser trabalhados é a colaboração (Até o dr Hakim deixa isso bem claro). Essa colaboração é concebida pensando na ideia de um casal onde cada um deve fazer sua parte para ajudar o outro, isso se reflete nas mecânica onde em alguns momentos a May deve seguir na frente e o Cody ir ajudando ela a prosseguir enquanto ele fica para trás e em outro momentos é o contrário, há sempre a ideia de que cada um tem o seu momento e que é importante ceder a vez e o protagonismo para o outro.

Diferentemente de AWO, It Takes Two apresenta maior variedades de mecânicas ao longo dos capítulos do jogo, no momento da cabana por exemplo cody ganha pregos e May um martelo, já na árvore dos esquilos a May recebe um arma de fósforos e Cody um canhão de seiva, há diversas outra mecânicas ao longo do jogo, porém todos seguem a mesma ideia, todas ela funcionam individualmente e em conjunto, há momento em que para atravessar um obstáculo é necessário somente ação de um deles e alguns momentos é necessário que as ferramentas sejam utilizadas em conjunto. Isso reforça um ponto importante na relação de um casal, onde em determinados momentos alguém deve ser proativo e resolver um problema, mas em vários outros o trabalho em conjunto é a única solução.

Esteticamente o jogo propõe um cartoon com detalhes que se comunicam diretamente com a concepção da história da obra. O cartoon aqui utilizado, faz sentido se pensar que esse mundo é criado por um livro “mágico” pelo pedido de uma criança inocente, o lúdico da tenra infância é trazido para a proposta estética, como se isso fosse um sonho de uma criança. Porém esse mundo criado pelo Dr. Hakim, não se perde em relação à realidade, as ações realizadas por ambos no mundo real afetaram esse “novo mundo”, como a cueca perdida do Cody que vira uma asa delta na árvore dos esquilos. O design dos personagens está ligado diretamente com a proposta do jogo, o boneco do Cody é feito de argila é a boneca da May é de madeira, a diferença entre ambos está em nível material, essa sacada é fantástica para expor na própria caracterização dos personagens o problema da separação.

O enredo consegue trabalhar os diversos problemas do casal de forma direta e inteligente, utilizando muito bem o cenário e as mecânicas para atingir esse objetivo, como na hora de trabalhar a atração, o Cody recebe metade de um ímã e a May recebe a outra metade. Ao superar cada um dos problemas do casal a aproximação vai ficando mais clara mas ainda com atritos presentes, principalmente nas falas das personagens. O título demonstra com genialidade os problemas que as brigas e discussões podem causar, às vezes as brigas de casais refletem em quem está próximo, mesmo os filhos, isso é retratado no jogo de forma espinhosa e machuca os jogadores na medida em que eles assumem esse papel de pais, é uma imersão que causa desconforto e desperta sentimentos e reflexões indesejadas e necessárias. O problema da reconciliação quando resolvido dá lugar ao problema dos sentimentos da Rose que ficam em segundo plano durante todo o jogo, e sua resolução apesar de simples, com uma única cinematic é o suficiente para concluir uma história excepcional.

Um detalhe interessante da obra é que eles realizam uma desconstrução no casal do Cody e May, Cody cuida e casa e gosta de jardinagem e May trabalha para sustentar a casa como engenheira e adora cantar, a forma como é desenvolvido essa inversão de um padrão conservador é assertiva, justamente por ter se colocado como natural, em nenhum momento é dado relevância para esse fato, a naturalidade faz com que a crítica seja profunda e abrangente.

It Takes Two consegue manter uma harmonia entre todos os elementos que o compõem enquanto obra, tudo se comunica entre si e funciona em conjunto para construir essa experiência que é apresentada brilhantemente pela Hazelight Studios. Em todo tipo de arte há certas obras que precisam ser consumidas, pois são feitas com excelência e exprimem a genialidade dos autores, It Takes Two é uma dessas obras.

A Way Out apresenta uma proposta de divisão do protagonismo entre os jogadores, trazendo a mecânica da tela compartilhada. O jogo, além de rememorar os tempos dos clássicos jogos em dupla de ps2, também reforça o ponto da divisão de tarefas e cooperação que é necessária em uma dupla de presidiários que está tentando fugir de uma prisão.

Essa proposta da gameplay compartilhada não apresenta somente cooperação entre os jogadores, há diversos momentos na história que ambos devem chegar em consenso tomando a decisão de como progredir na história, além de diversos minigames presente ao longo do jogo que proporciona uma disputa amigável entre os jogadores.

O jogo tem grande parte de sua história apresentada por cinematics que por um lado é bom, pois dá mais qualidade a imersão em momentos chaves da história e por outro lado é ruim, pois tira parte do protagonismo do jogador enquanto motor da história. Além disso, o tempo demasiado de cinematic faz o jogo se tornar quase um filme, isso também é reforçado pela curta duração do gameplay.

Essa parte cinematográfica acontece até pelo fato de as coisas não serem repetitivas, que é algo muito comum em jogos. Ao chegar em um lugar e achar um obstáculo o jogador não é obrigado a percorrer todo o caminho de volta para acessar a localidade novamente, como por exemplo, ao fugir da prisão há um momento que os jogadores devem conseguir lençóis para fazerem uma corda para auxiliar na fuga, ao conseguir os lençóis os jogadores não precisam ir até o mesmo local novamente andando, há um corte no jogo e ambos aparecem de frente ao objetivo.

Acho que, considerando a experiência do jogador, A Way Out apresenta uma melhor imersão caso seja jogado por amigos, até por conta das mecânicas de cooperação para realizar as ações, da sinergia, pois alguns momentos há ações que precisam ser realizadas simultaneamentes, como derrubar portas por exemplo, e ainda o jogo necessita que os jogadores entre em consenso quanto às decisões e que conciliem conflitos. A camaradagem que é formada dentro do jogo pelas personagens necessita de uma forte amizade por parte dos jogadores para acontecer. A relação extra jogo influencia na experiência in game.

O desenvolvimento do jogo como um todo é rápido sem enrolação e sem tempo para distração, é quase impossível, por exemplo, jogar esse jogo ouvindo uma música. A forma como as personagens do jogo Leo e Vicent progridem com sua amizade é cadenciada e sem forçação de barra, a Hazelight Studios conseguiu realizar esse desenvolvimento dos personagens de forma natural e amigável tornando a experiência do jogador muito mais gratificante.

O desfecho do jogo é incrível, pois todo aquele clima de camaradagem construída pelas personagens ao longo do jogo é quebrada abruptamente e os jogadores são jogados um contra o outro, esse plot twist não é só um plot do enredo ele é um plot de toda a proposta do jogo e poderia colocar em risco toda a obra. Porém, a Hazelight Studios foi brilhante e ousada ao mesmo tempo, sem medo de arriscar, propôs esse confronto final não desejado, tanto pelos personagens quanto pelos jogadores. Esse confronto não desejado pela parte dos personagens fica claro no momento do confronto onde a câmera dos jogadores continua dividida e ambos veem o que o outro está fazendo e onde está se escondendo, essa proposta inicial da divisão de tela auxilia na sensação que é passado aos jogadores de não adesão ao confronto. Eu, enquanto jogador, não desejei matar esse meu amigo que estava jogando comigo o tempo todo desde o começo do jogo, e essa sensação é aumentada com a mecânica das telas divididas presente durante todo o confronto final.

Ainda comentando sobre o desfecho do jogo, esse final duplo proposto faz sentido na história de ambos os personagens, que são ambíguos quanto a sua história de vida e que foram reunidos “por acaso”. Os objetivos de ambos divergem, a confiança é traída, só um pode sobreviver, pronto, o cenário para o desfecho está dado. Esse cenário construído, choca os jogadores ao expor a dura realidade sobre as relações de amizade, pois, nem sempre amizades forjadas em momentos difíceis e por necessidade de sobrevivência são resilientes e verdadeiras.

Em relação a estética, essa abordagem realista casa muito bem com o próprio tema abordado pelo enredo do jogo, a prisão, a vingança, a necessidade de acerto de contas por ambos os personagens. Os cenários apresentados servem diretamente ao propósito do jogo, sem espaço para exploração e descoberta de locais secretos, a estética realista é direta e objetiva bem centralizada no escopo da obra e servindo mais a história do que a qualquer outra coisa.

A jogabilidade é fácil e bem intuitiva, não necessita necessariamente de indicadores ou guias, tudo é meio óbvio e ao mesmo tempo complexo, pensando nos planos elaborados pelas personagens. A tela dividida já citada, lembra bastante os clássicos jogos de ps2 e traz consigo alguns aspectos que compõem a ideia do jogo, principalmente a ideia de trabalho em equipe.

Pensando A Way Out enquanto uma experiência artística é fantástica, o jogo desenvolve uma história compartilhada onde o próximo é necessário, busca uma cooperação entre os pares e depois quebra essa cooperação e desemboca em um conflito inesperado. Essa quebra de expectativa de uma certa linearidade na história choca sem surpreender, pois o modelo utilizado não é uma novidade, na realidade é quase um clichê, porém clichês podem ser obras esplêndidas caso bem implementados, e isso é A Way Out.

2022

Stray é uma experiência felina fantástica, onde realizando gatinagens pela cidade na tentativa de escapar de lá, enquanto gatinho, o jogador durante a sua jornada acaba ajudando essa cidade e os amigos que fez nela.

A proposta do jogo encarna algo da própria natureza instintiva de um gato, pois ao se separar de seus amigos o principal objetivo do jogador enquanto o gato é reencontrá-los. A história do jogo propõe como objetivo final esse reencontro e para alcançá-lo é necessário vivenciar esse novo ambiente em que o gatinho se encontra. A jornada é gratificante como um todo, as personagens apresentadas e que fazem parte da construção da história são marcantes cada uma a seu jeito, há sempre, em cada uma delas um sentimento de afeição para o jogador, a sensação de segurança ao interagir e ser guiado por elas pelas tarefas é inegável. Até por isso que no momento de traição de uma delas a surpresa nos atinge como um cruzado, é inesperado em vários sentidos.

Essa ideia da natureza de um gato e a personificação do jogador como um passa pelos detalhes que o jogo propõe, como por exemplo a falta de um nome para o gato ou mesmo a incapacidade de entender a comunicação de outras espécies, pelo menos em um primeiro momento no jogo. Essa falta de atributos “humanos” nesse animal aproxima o jogador da experiência de se transpor em um animal, quase como uma simulação, isso faz com que todas as experiências vividas durante a história sejam personificadas pelo jogador.

Agora, falando do conteúdo dessa jornada vivida em Stray sinto um caráter investigativo muito forte, há sempre segredos a se descobrir, como por exemplo: onde estou? Quem são esses inimigos? Como sair daqui? Quem é esse robozinho B-12?, esse caráter pode ser observado inclusive no dronezinho B-12, já que um dos objetivos do jogo é recuperar as memórias perdidas do mesmo.

Pensando na ambientação do jogo, os cenários apresentados são diversos, principalmente considerando o tamanho do jogo que não supera as 9 horas de gameplay até seu término. A diversidade de cenários trabalha no eixo da ideia de “cidade”, contendo o exterior da cidade logo no começo, as favelas, esgotos, apartamentos, cidade alta, fábricas e centro de comando. Esses cenários, apesar de não serem grandes em extensão, são bem trabalhados e detalhados tendo cuidado com cada elemento presente nele, aumentando em muito a imersão do jogador, assim proporcionando uma experiência satisfatória.

Em relação a estética do jogo sinto que o grau de realismo surpreendente, tanto o utilizado no cenário quanto no gatinho. Ao se deparar com a qualidade do realismo, há uma impressão de se estar dentro de um “simulador de gato”, porém considerando os personagens presentes no jogo, fora o gato, essa sensação é atenuada. Isso acontece pois os demais personagens apresentam menor grau de realismo e transitam para algo mais lúdico e cartunizado, por exemplo os robôs com suas caras de TV e os Zurg’s que parecem uns bichinhos de pelúcia assassinos. Essa proposta estética da mistura entre o cartoon e o realismo me agrada, porque ela conversa bem com a proposta do jogo de se estar na pele de um gato(realismo) e o cartoon utilizado dessa forma apresenta-se como uma ferramenta de suspensão de descrença, que é necessária em uma história de um gato salvador de cidades.

Outro ponto estético que vale a pena ressaltar é a trilha sonora, ela trabalha muito bem como elemento de imersão do jogador no ambiente, essa ressalta a atmosfera cyberpunk apocalíptica presente no jogo.

Analisando as mecânicas do jogo, o jumping puzzle como proposta faz sentido pensado nas características naturais de um gato, um animal esguio, que gosta de subir em tudo e andar em lugares nada comuns. Além disso, o jumping puzzle presta-se para dar protagonismo ao jogador e fazê-lo sentir-se como motor da história do jogo ao efetivamente realizar as ações que movimentam o enredo. O drone B-12 funciona muito bem como elemento sentimental, no sentido de aproximar o jogador dos sentimentos das outras personagens e também criar uma relação de sentimentos interpessoal entre o gatinho e o robô.

Geralmente é nesse momento que eu cito os lados negativos dos jogos que eu busco analisar, felizmente não me vem nenhum ponto negativo em mente que valha a pena ser comentado, talvez os dois únicos problemas - que não são problemas de verdade - seja o fato de não haver customização para o gatinho, e que infelizmente o jogo acaba rápido demais.

Borderlands 3 constrói uma narrativa épica onde o jogador terá que salvar o universo da destruição iminente, e não mais um planeta ou uma lua, porém essa destruição parece demasiadamente simples pensando em proposta apocalíptica.

Sempre o grande ápice da história dos jogos de borderlands é a abertura de uma sepultura, aqui é rebaixado de importância para dar espaço ao novo mal, a grande sepultura onde está o maior mal já visto antes. A narrativa para a abertura dela é demais, casa-se muito bem com a proposta de algo grandioso, a chave para abri-la é divida em 3 outras sepulturas que precisam ser abertas e conquistadas, com isso o escopo do jogo é expandido a novos horizontes, há sempre uma mini-história para cada arca que precisa ser aberta, criando assim uma história gigantesca.

As mini-histórias carregam disputas interessantes como a corporação Atlas contra a Maliwan, e os Filhos da Arca contra a corporação Jacob’s, e é interessante que tanto Atlas e Jacob’s são corporações que estão ligadas às dlc’s do primeiro jogo. A cada sepultura aberta o jogador recebe novas habilidades sobrenaturais de artefatos eridianos presentes nas arcas, isso proporciona um senso de progressão bom e difere dos clássicos níveis e reputação presente em todos os jogos da franquia.

Outro ponto positivo do jogo é o abandono daquele velho modelo de plot twist baseado na traição de uma das personagens, isso estava massante e previsível, até porque isso já aconteceu em todos os outros jogos da franquia. No borderlands 3, a aposta vai para um mistério ao redor dos vilões e o plot girando em torno dos segredos revelados, que, apesar de não ser inovador, dá novos ares para um modelo de enredo engessado comum aos jogos da franquia.

Os plot’s do jogo são bem desenvolvidos e emocionantes, como a Lilith perdendo os poderes, a Maya morrendo, a Tannis virando uma sereia, assim como a Ava tomando os poderes da Maya. O desfecho dos gêmeos é muito bom, o jogador descobrindo como eles sabiam das sepulturas e de quem eles eram filhos.

Borderlands 3 se atualiza muito bem em relação às mecânicas, a primeira atualização presente que é muito boa é em relação às ultimate's que em cada personagem se tem 3, dando maior variabilidade de gameplay dentro do mesmo personagem, além dessa tem-se uma maior investimento nos diálogos do personagem do jogador com os npc’s tornando a experiência de se jogar mais rica e imersiva.

O jogo tem seu universo expandido a novos níveis, a história passa-se por diversos planetas, cada um com suas características marcantes que proporcionam uma diversidade estética ao jogo. Ainda pensando na estética a introdução de skins dá um novo tempero estético ao jogo deixando aquele aba de personalização da própria experiência estética ao jogador. Os cenários, fauna e flora são concebidos acertadamente, sempre apresentando grande diversidade e referências clássicas aos jogos antecessores da franquia.

Um problema em relação a história do jogo tem-se ali no desfecho da história quando o grande monstro da arca é o destruidor, que é o mesmo boss final do primeiro jogo da franquia, a Tyreen ao se fundir com ele é grande inimigo final, faz pouco sentido que o destroyer faça parte desse plano, até porque ele foi derrotado no primeiro jogo em Pandora, agora ele aparece em Nekrotafeyo e dezenas de vezes mais poderoso. Seria necessária uma tremenda ginástica mental para isso ser aceito por que experiencia a obra, mas isso não acontece, não se tenta explicar nada. É isso, borderlands 3, decepciona além da conta no seu desfecho, sem contar que a luta final é mecanicamente muito simples, só com uma adição boba de um parkour, queria eu que a batalha final mecanicamente fosse mais parecida com o guardião da arca de Éden-6.

No geral, a experiência de se personificar enquanto um personagem salvador de um universo entrando em colapso é divertida e gratificante. Borderlands 3, consegue ser fiel ao que já foi apresentado nos jogos anteriores e expandir o universo de forma assertiva, além de utilizar personagens que foram importantes nos títulos anteriores da franquia criando assim uma conexão entre os diferentes jogos.

Em relação as dlc’s, as propostas são bem executadas e muito divertidas, dessa vez elas trabalham até para a expansão do universo, pois cada uma apresenta um novo planeta e nele que a história se desenrola, a DLC Bounty of Blood é simplesmente fantástica, a idéia desse velho oeste que nunca antes havia sido explorada se casou muito bem com a proposta do borderlands, os inimigos, a vilã e toda a história tem um fluxo cadenciado e não é enjoativo em nenhum momento. A DLC do Krieg nos conta mais de sua história, e é interessante no sentido de explorar mais um personagem de DLC presente no Borderlands 2. A DLC da Moxy e do Jack é legal até porque ressuscita mais uma vez provavelmente o vilão mais marcante de toda franquia. E por último a DLC do casamento entre o Hammerlock e o Jacbo’s é maravilhosa, ela aborda um lugar onde um monstro da sepultura saiu e morreu nesse planeta, seus restos são utilizados como fonte de energia pela comunidade local, o único problema é que esse monstro parece ter saído de um conto de lovecraft. Nesse local no mínimo hostil hammerlock e Jacbo’s resolvem realizar o casamento, contando com a personagem Gaige do segundo jogo da franquia o jogador embarca nessa aventura medonha que é extremamente bem desenvolvida e faz jus ao aspecto de terror lovecraftiano.

Borderlands: The Pre-Sequel revela a ascensão de um ditador enquanto tenta explicar algumas dúvidas que estavam presentes na mente dos jogadores, uma pena que as explicações se atentem, em grande parte, a pontos pouco importantes e deixem de lado as principais indagações. Além disso, com um trabalho ruim da Gearbox Software, a lógica da história entre os jogos de borderlands foi praticamente destruída.

Como proposta do jogo, o enredo baseia-se na queda da corporação Dahl, que é desencadeada com a abertura da cripta no jogo 1, e a ascensão da corporação hyperion como a corporação dominante de Pandora, que é o enredo do segundo jogo.

Normalmente as propostas de jogos pre-sequel tendem a ser jogos mais explicativos e de referências, eles geralmente buscam explicar alguns pontos que não foram explicados na sequência a que ele é destinado, sem necessariamente deixar de ter uma história própria com uma identidade individual e que ainda consiga complementar a sequência. Isso acontece em Borderlands: The Pre-Sequel, onde a história apresenta uma identidade própria sem se limitar a ser uma mera explicação do acontecimentos do jogo 2 e as consequências do jogo 1.

Essa identidade do jogo pode ser observada quando findado a disputa entre a Zyperdon e Jack a subtrama da cripta assume a titularidade do enredo e abre novos caminhos para essa história “explicativa”.

Além da proposta explicativa - que baseia-se na explicação dos acontecimentos que ocorreram tanto no primeiro quanto no segundo jogo -, ainda é utilizado uma proposta investigativa, observado pelo fato de todos os acontecimentos do jogo serem narrado pela Athena, uma personagem jogável que já vivenciou tudo o que acontece. O jogador deve investigar o que aconteceu com essa personagem e entender as motivações que a levaram a tomar certas atitudes.

A ambientação de Borderlands: The Pre-Sequel é interessante, ao invés de explorar ainda mais o ambiente de pandora demasiadamente utilizado ele apresenta a nave da corporação helios e a lua de pandora. A nave já havia tido grande importância no jogo 2, já que ela que destrói os escudos do Santuário e a partir dela que os robôs de Jack são enviados para matar o jogador. Sobre a lua de pandora, além do novo cenário proposto e a caracterização dos inimigos “espaciais” com os trajes de astronautas e afins, é interessante adicionar a mecânica de oxigênio com o ‘esmagar’, diferenciando mecanicamente o jogo dos seus antecessores e passando a ideia de um lugar novo, a mecânica utilizada auxilia nessa sensação de novo e diferente.

Borderlands tem problemas sérios quanto a história do jogo, pensando cronologicamente, os acontecimentos no final do jogo como: Jack tendo a visão sobre o Guerreiro que ele tentará controlar no jogo 2, a visão sobre a importância das sereias e do eridium, fazem sentido na história do segundo jogo, porém não fazem nenhum sentido considerando a história do primeiro jogo, já que o jogador no primeiro jogo abre a cripta por conta da Angel que, por ordem de Jack, “controla” as ações do jogador, só que no borderlands: the pre-sequel mostra que Jack não poderia ter feito isso durante o primeiro jogo, pois ele não tinha o conhecimento do poder das sereias e da importância da cripta só, já que esse game acontece entre o borderlands 1 e 2. Enfim, o conteúdo da visão no final do jogo quebra a ideia do “controle” que Jack tem sobre o jogador no primeiro jogo da franquia. Além disso, as principais dúvidas que precisavam ser explicadas não foram, dúvidas como: quem é a mãe da Angel? Como as sereias podem ser aprisionadas e controladas?, entre outros.

A estética desse jogo da franquia apesar de seguir os parâmetros de seus antecessores apresenta uma característica mais realista, isso provavelmente acontece pela evolução gráfica que se tem desde o primeiro jogo lançado em 2009 e o borderlands: the pre-sequel lançado em 2014. Essa nova “estética” agrada e conversa muito bem com o jogo sem causar uma “revolução” e perder as raízes advindas dos títulos anteriores.

Em relação a jogabilidade e mecânica, o jogo se diferencia bastante dos antecessores, os 6 personagens jogáveis tem mecânicas únicas na habilidade de ação apresentando novidades a serem exploradas pelos jogadores. A mecânica de armas a laser e armas criogênicas deixa disponível para os jogadores novos caminhos a serem explorados tanto na build dos personagens quanto na organização dos conjuntos de armas.

Apesar da campanha ser relativamente curta, ela não deixa de ser profunda, a história apresenta várias camadas que são bem exploradas e os personagens são bem aproveitados em missões secundárias que são divertidas e que acrescentam no escopo global da obra, principalmente se tratando da história principal. Outro ponto positivo foi o vilão final que sai da monotonia de monstros gigantescos e apresenta essa característica mais humanóide, além disso, a porta da cripta não é simplesmente aberta e um monstro gigantesco sai lá de dentro, nesse jogo a cripta é aberta e os seres do cripta começam a invadir o universo do jogador, logo há vários deles presentes antes de se chegar ao boss final propriamente dito.

A dlc Claptastic Voyage é a única dlc do jogo que apresenta adição no enredo do jogo e explica a importância do Claptrap amarelinho que te guia. A dlc propõe o lado cômico como eixo principal da história, ao adentrar a “mente” do claptrap e observar os sonhos, desejos, medos, tudo é apresentado de forma cômica e lúdica. Além de ser muito divertida de se jogar, apresenta uma história que aprofunda em um dos personagens característicos do jogo, mostrando o lado mais “humano” do pequeno robozinho amarelo, fazendo o jogador amar ainda mais esse robô safado.

A sequência de borderlands, Borderlands 2, é um título demasiadamente dependente do título anterior. Relevando os pontos negativos que isso traz, o jogo consegue apresentar uma história profunda e emocionante em um ambiente biodiverso tomado por bandidos e por uma corporação ditatorial.

Diferentemente de borderlands 1, o segundo jogo da franquia muda sua abordagem em relação a construção do enredo, no primeiro jogo a abordagem é exploratória, um novo mundo onde nada é conhecido e ao decorrer da história o jogador se ambienta ao cenário, aos personagens, ao universo que o rodeia, no segundo jogo o cerne da trama é dado logo de início e a construção se dá por adendos ao passado, tanto os acontecimentos vivenciados no primeiro jogo quanto os acontecimentos descritos pelas personagens principais.

Quanto às personagens principais, vale a pena ressaltar a ideia interessante de utilizar os personagens jogáveis do primeiro jogo e toda a história vivenciada por eles, no caso, pelo próprio jogador, como motor para a história do segundo jogo.

Ao contrário de outras sequências de jogos que fazem referências pontuais às histórias passadas, essa obra embasa boa parte da sua história no jogo anterior, o que tem seus pontos positivos e negativos. Os pontos positivos estão na possibilidade de se criar uma história mais profunda, desenvolvendo e detalhando cada personagem, enriquecendo o enredo e o universo do jogo. Pelo lado negativo, os jogadores que não jogaram o primeiro título terão certa dificuldade de entender boa parte da história, pois apesar de apresentar uma sequenciamento com início, meio e fim, o jogo necessita demasiadamente de uma base presente no primeiro jogo, com isso, extrapola os limites da obra proposta e se confunde em alguns momentos com um apêndice do primeiro jogo.

Essa abordagem de apresentar o ponto principal da trama do jogo logo de cara é diversas vezes perigoso, pois sempre é necessário retomá-la ao longo da história para que ela não seja esquecida e se torne banal, para isso as informações acerca desse cerne precisam ser disponibilizadas aos poucos e com certa frequência fazendo uma construção progressiva desse objeto da trama. Borderlands 2 faz isso com maestria, onde com a narração do marcus e a cena inicial do trem é apresentado o vilão do jogo, e com isso a progressão para se chegar nele e o enfrentar é progressiva. O vilão ao longo da história sempre continua a tentar matar e atrapalhar o jogador a realizar as tarefas, isso somado com as missões secundárias que apresentam o passado dele, alimentam a figura de vilão que é apresentada no começo do jogo, e como isso ocorre ao decorrer da história a figura dele sempre fica presente na memória do jogador e não é banalizada.

Em relação a ambientação, o jogo nos apresenta um cenário bem mais desenvolvido em comparação com o primeiro jogo, lá onde tudo é meio monocromático esteticamente, onde sempre é passado a ideia de aridez, seca e escassez, no segundo título há uma reviravolta estética, onde os cenários se divergem com frequência, ainda mantendo, em alguns momentos, a atmosfera árida, mas à enriquecendo com biomas de geleiras, vulcânicos e até rodeado por minerais alienígenas. A fauna apresentada nesse jogo é muito mais rica, ainda utilizando os animais característicos do primeiro título e adicionando vários outros, essa diversidade da fauna acompanha a diversidade dos biomas. Essa remodelação estética é gratificante pois há a sensação de realmente existir um planeta gigantesco que está repleto de mistérios e precisa ser explorado.

O cartoon como escolha estética para a produção do jogo se comunica muito bem com a parte cômica, uma das marcas registradas da sequência, pois é mais fácil para o público ligar o cômico com o cartoon, dado todos os desenhos infantis que a maioria das pessoas consomem desde a infância. Esse casamento de gênero com estética, é melhor desenvolvido nesse jogo, as piadas não se destoam do jogo, não parece que em algum momento específico foi dita uma piada especificamente para o jogador, ela é sempre inserida no próprio contexto do jogo e na construção das personagens.

Há presente no jogo uma abordagem intimista em relação aos personagens secundários e npc’s, isso se dá pela melhor construção das missões secundárias - principalmente se comparado com o primeiro jogo -, aqui você adentra na pessoalidade de vários personagens e conhece mais sobre sua história de vida, relacionamentos e aflições.

Ao analisar os problemas do jogo, é necessário entender a abordagem expositiva do enredo, onde se tem a trama principal exposta e a história gira em torno de acontecimentos para concluir essa trama. O problema está no fato da trama ser baseada demasiadamente no passado dos personagens e no primeiro jogo da franquia, criando um apêndice do jogo um, borderlands 2 não é uma obra fechada em si, ela depende demais de seu antecessor, por vezes parece quase um borderlands 1.5, e quando a obra tenta ganhar sua identidade própria ela deixa de explicar muita coisa que se passa no passado das personagens e esse, provavelmente, é o motivo da necessidade de borderlands pre-sequel.

Acerca das DLC’s elas apresentam uma abordagem diversificada, e vale a pena discorrer separadamente sobre cada uma delas.

A primeira DLC lançada, a da Capitã Scarlett exibe características recorrentes no jogo base, biomas e fauna diferenciados, personagens malucos porém não mais que o próprio enredo, na dlc um novo continente é apresentado com uma história linear e meio previsível mas sem deixar de ser interessante, é exibido novos inimigos, monstros e um veículo. Porém todo esse novo conteúdo é simplesmente diferente e novo, nada além disso, isso acontece porque nesta dlc não existe quase nenhuma ligação com a história ou personagens do jogo base, portanto não demonstra grande relevância para o escopo global da obra.

A DLC do Mr. Torgue’s é uma clara referência para a arena da Moxxi, uma das dlc’s do primeiro título da franquia, isso tanto pelo da história girar em torno de lutas em uma arena tanto pelo fato da estética árida característica do primeiro jogo. Essa dlc me parece seguir uma ideia parecida com as dlc’s do borderlands 1, pois exibe uma das corporações vendedoras de armas de pandora que nunca havia sido apresentada antes, além das referências já citadas. Os personagens secundários do jogo base são utilizados e aprofundados, além de trazer uma história intrigante como uma clássica “jornada do herói”, acredito que esta seja uma das melhores dlc’s do jogo.

Em Sir Hammerlock’s Big Game Hunt a fauna que é expandida no jogo base ganha novas proporções, utilizando o personagem do jogo base Sir Hammerlock’s, um exímio explorador e caçador, o jogador é posto em um ambiente de caça a monstros exóticos, esse foco da trama é dividido com a busca a nave caída da hyperion do professor Nakayama. Esta divisão da trama tem alguns pontos negativos, pois, diversas vezes elas não conversam entre si, o enredo tenta abordar os dois pólos de maneira cômica mas se perde na execução e isso torna a ideia de “grandes caçadas a monstros exóticos” um fiasco. Citando alguns pontos positivos, o que mais me impressiona nesta dlc é a imersão proporcionada pelo ambiente, você realmente se sente em um novo continente, os inimigos como nativos tribais, os monstros exóticos e a própria elaboração estética dos mapas realmente passa a sensação de um lugar exótico e inexplorado. O borderlands sempre entrega grandes inimigos e desafios no final de cada dlc mas esse “vilão” por sua própria personalidade, atitude e o fim que ele encontra o torna um dos personagens mais toscos e engraçados da história.

Tiny Tina’s Assault on Dragon Keep é de longe a melhor dlc do jogo, explorando quase todos os personagens apresentados no jogo base - lembrando bastante a dlc do claptrap no primeiro jogo -, apresenta uma abordagem de rpg dentro de um rpg, o jogador se vê jogando um jogo de Dungeons & Dragons narrado por Tiny Tina, uma menina psicopata de 13 anos, essa breve descrição já deu a entender os absurdos que acontece nessa “campanha” jogada pelo jogador, os paradoxos engraçados que acontecem tem sentido pois são a ideia de uma criança maluca “tornando realidade”, tipo um dragão aparecendo do nada na sua frente e te matando em um hit. Como um belo RPG de D&D o cenário medieval é explorado e bem implementado, os inimigos característicos não deixam nada a desejar, a estética é perfeita para a proposta da DLC. Juntando todos os pontos positivos já expostos, a dlc ainda apresenta um lado mais intimista das personagens no momento em que elas têm que lidar com os sentimentos de perda e dor, isso tudo dentro de um processo de aceitação com a cinematic final. A DLC é sensacional, é uma história que precisa ser contada pois ela reflete um dos pontos principais da história do jogo base, não é atoa que no ano de 2022 essa dlc tem um continuação como um jogo solo.

Ps: Adorei o fanservice do retorno a fyrestone e as missões secundárias características do primeiro jogo.